Membro
destacado da Igreja apostólica, inflamado de zelo pela conversão dos pagãos.
(por Plínio Solimeo)
Nos primeiros
dias da Igreja o fervor dos cristãos era tão grande, que eles renunciavam a
seus bens, colocando-os à disposição dos Apóstolos para que os utilizassem em
proveito de todos: “Repartia-se então a
cada um deles conforme a sua necessidade” (Atos 4, 35). Sem ser
obrigatória, esta prática se tornava possível devido ao pequeno número de
fiéis. Com o crescimento da Igreja, ela continuou a florescer nas ordens
religiosas.
Entre esses
generosos cristãos destacava-se um, pelo que é nomeado por São Lucas: “Assim
José – a quem os Apóstolos deram o sobrenome de Barnabé que quer dizer filho da
consolação –, levita natural de Chipre, possuía um campo. Vendeu-o e trouxe o
valor dele e depositou-o aos pés dos Apóstolos” (At 4, 36-37).
Segundo tradição
oriental Barnabé se radicou em Jerusalém, e tendo ouvido Nosso Senhor pregar no
Templo, tornou-se admirador de sua doutrina. Por seu zelo e conselhos, mereceu
ser chamado Apóstolo, apesar de não ser dos 12. Era grave e afável, com
amplidão de vistas e chama profética, e, sobretudo, como diz São Lucas, “homem bom e cheio do Espírito Santo” (At
11, 24).
Por tais
predicados, São Barnabé tornou-se muito considerado naqueles tempos da
primavera da fé. Seu porte devia impressionar, pois mais tarde os pagãos o
tomaram por Zeus, o pai dos deuses entre os gregos.
Quando o recém
convertido São Paulo procurou os Apóstolos em Jerusalém, eles tentaram evitar
sua presença, pois ninguém podia crer que esse perseguidor de cristãos se
tornara agora um deles.
Segundo a
tradição, São Barnabé – a quem São Paulo deve ter narrado todos os pormenores
de sua conversão – conhecera o Apóstolo dos Gentios na escola de Gamaliel.
E convencido da
sinceridade de seu ex-condiscípulo, serviu-lhe de “anjo da guarda”. Conduziu-o
e apadrinhou-o junto a São Pedro e São Tiago, pois além desses, diz São Paulo,
“não vi nenhum outro Apóstolo” (Gal 1,19). São Barnabé “contou-lhes como Saulo
vira o Senhor no caminho, e que lhe havia falado, e como em Damasco pregara com
desassombro o nome de Jesus” (At 9, 27).
Depois de ter
passado 15 dias com São Pedro, por causa das ciladas dos judeus “os irmãos
levaram-no [São Paulo] para Cesaréia, e dali o enviaram a Tarso” (At 9, 27-30).
São Barnabé procura o auxílio de São Paulo
Entretanto, os
fiéis disseminados pela perseguição que se seguiu ao martírio de Santo Estevão
iam espalhando por toda parte a semente da palavra divina. Desse modo alguns
deles, “de Chipre e de Cirene”, foram para Antioquia, onde pregaram a boa nova
da salvação: “A mão do Senhor estava com eles, e grande foi o número dos que
receberam a fé e se converteram ao Senhor” (At 11, 21). Notícias desse sucesso
chegaram aos ouvidos dos Apóstolos, que enviaram Barnabé para verificar o
espírito que presidia a essa nova cristandade.
São Barnabé “alegrou-se, vendo a graça de Deus, e a
todos exortava a perseverar no Senhor com firmeza de coração, pois era um homem
de bem e cheio do Espírito Santo e de fé” (At 11, 23).
Humilde, esse
apóstolo não se julgou apto para orientar os novos cristãos sozinho. Lembrou-se
então de Saulo, e foi buscá-lo em Tarso para ser seu companheiro de apostolado.
São Paulo estava
em pleno vigor varonil e na força de seu primeiro entusiasmo. Se a igreja de
Antioquia já experimentava antes um grande impulso, com os dois Apóstolos
cresceu ainda mais.
Eles
permaneceram um ano inteiro naquela cidade, onde pela primeira vez os
discípulos de Jesus começaram a ser conhecidos como “cristãos”. Essa foi também
a primeira igreja a desligar-se do solo originário do judaísmo.
Quando houve
fome em toda a Palestina, Paulo e Barnabé foram escolhidos para levar o auxílio
dos antioquenhos aos cristãos de Jerusalém (At 11,30).
A primeira viagem apostólica
Os dois
apóstolos continuavam a dirigir com fervor a cristandade de Antioquia. Certo
dia, “enquanto celebravam a liturgia em honra do Senhor e guardavam os jejuns,
disse o Espírito Santo: ‘Segregai-me Barnabé e Saulo para a obra a que os
chamo’”. Essa obra seria a primeira viagem apostólica (At 13,2). “Então, depois de jejuarem e de orarem, eles
[os anciãos] lhes impuseram as mãos e os despediram” (At 13, 3).
“Essa imposição
das mãos sobre Saulo e Barnabé era a ordenação episcopal? É o sentimento geral.
A vocação milagrosa para o apostolado, não tendo isentado Saulo da obrigação de
receber o batismo das mãos de Ananias, não se vê por que essa mesma vocação o
teria isentado de receber o sacramento da Ordem. Nas vocações mesmo
extraordinárias, Deus, que age sempre com medida, não suprime as regras que
estabeleceu”.1
Os dois
Apóstolos tomaram consigo São Marcos e partiram para a grande aventura
apostólica.
Provavelmente
foi São Barnabé quem propôs passarem por Chipre. Desembarcaram no porto de
Salamina, perto de Famagusta, de onde era originário. Ele sabia que todas as
cidades do lado oriental da ilha contavam com prósperas sinagogas e que havia
nelas grupos de cristãos (At 11, 19).
São Barnabé –
que dirigia a missão – resolveu então atravessar a ilha até Pafos. Nessa cidade
residia o procônsul romano Sérgio Paulo, “varão prudente”. Este, sabendo da
chegada de Barnabé e de Paulo, chamou-os, “desejando ouvir a palavra de Deus”
(At 13, 7).
Depois de um
incidente com o mago Bar-Jesus – judeu e falso profeta, que desejava impedir de
todos os modos o contato do procônsul com os Apóstolos e que ficou cego após
ser increpado por São Paulo –, o procônsul creu.
Admirados pelos prodígios que realizavam, Paulo e Barnabé foram "adorados" como deuses pelos pagãos que evangelizavam. |
Abrindo para os pagãos as portas da fé
Na pequena
cidade de Listra, São Paulo curou um paralítico de nascença. Devido a esse
milagre os pagãos quiseram adorá-lo como deus, gritando que Zeus (ou Júpiter) e
Hermes (ou Mercúrio) “desceram a nós”. Diziam que São Paulo, por causa de sua
eloqüência, era Mercúrio, e São Barnabé, por seu digno e majestoso porte, era
Júpiter. Foi difícil aos missionários convencer a multidão de que eram homens,
e não deuses. “Porém, judeus vindos de Antioquia e de Icônio seduziram as
turbas, que apedrejaram Paulo e o arrastaram para fora da cidade, deixando-o
como morto” (At 14, 18-19).
Posteriormente,
os dois apóstolos pregaram em Derbe, na Galácia, e na volta fizeram o caminho
inverso para visitar e firmar as cristandades por eles fundadas. Retornaram
então a Antioquia da Síria, depois de quatro anos de ausência (At 14, 23-26).
Os apóstolos “tinham aberto para os pagãos a porta da fé” (At 14, 27).
Surgiu então um
incidente com os cristãos judaizantes: insistiam que os pagãos convertidos
deveriam submeter-se aos ritos judaicos: “É preciso circuncidá-los e impor-lhes
a observância da Lei de Moisés” (At 15,5).
Ora, “fazer a
admissão daqueles [pagãos] na Igreja depender da circuncisão e da Lei ritual,
significava reduzir a Igreja à estreiteza da Sinagoga, e negar a universalidade
da redenção”.2 E era exatamente isto que desejariam os judaizantes, como revela
o próprio São Paulo (Gal. 2,4). Tanto ele como São Barnabé eram contrários a
essa medida. Resolveu-se então que iriam a Jerusalém decidir a questão com os
Apóstolos.
Na assembleia
dos Apóstolos na Cidade Santa, considerada o primeiro Concílio da Igreja, São
Pedro e São Tiago Menor, sobretudo, declararam-se a favor dos dois apóstolos,
contanto que os cristãos oriundos do paganismo se abstivessem das
“contaminações dos ídolos, da fornicação, das carnes sufocadas, e do sangue”
(At 15, 6-21).
Os Apóstolos
enviaram Judas e Silas “com os nossos
amados Barnabé e Paulo, homens que têm exposto suas vidas pelo nome de nosso
Senhor Jesus Cristo” (At 15, 25-26) para transmitir aos fiéis de Antioquia
a decisão a que haviam chegado. Silas permaneceu depois em Antioquia,
associando-se a São Paulo em suas viagens apostólicas.
São Paulo “resiste em face” ao primeiro Papa
Mas depois
ocorreu outro fato a que São Lucas não se refere, e que mostra como a situação
continuava ainda crítica por causa da influência dos judaizantes. É o próprio
São Paulo quem narra aos Gálatas, com muita vivacidade, esse penoso conflito: “Quando Cefas foi a Antioquia, resisti-lhe
em face, porque ele se tornara repreensível. Pois, antes de virem alguns dos de
Tiago, ele comia com os gentios; mas, quando aqueles chegaram, ele se retraía e
se afastava, por medo dos da circuncisão. E os outros judeus o acompanharam na
mesma simulação, tanto que até Barnabé se deixou arrastar à simulação deles”
(2, 11).
Palavras duras
estas do Apóstolo Paulo em relação ao primeiro Papa! É bom notar que se tratava
não de um erro doutrinário de São Pedro, mas de uma atitude prática, se bem que
com repercussões muito sérias para o futuro da Igreja. Convém ressaltar também
que São Pedro estava inteiramente aberto ao apostolado de São Paulo com os
pagãos e lhe deu razão. Ele próprio, no início, sentia-se confortável no meio
deles.
Se mais tarde
creu que era seu dever acomodar-se às circunstâncias, não foi porque pensasse
de modo diferente de São Paulo. Ocorreu que, sendo especialmente encarregado de
pregar o Evangelho aos judeus, talvez por receio de ofendê-los, começou a
separar-se da mesa dos fiéis provenientes da gentilidade. E essa atitude
equívoca arrastou outros judeus, até mesmo a São Barnabé.
Pelo que,
continua São Paulo: “Mas, quando vi que
eles não caminhavam com retidão segundo a verdade do Evangelho, disse a Cefas
diante de todos: ‘Se tu, sendo judeu, vives como gentio e não como judeu, por
que obrigas os gentios a adotar costumes judaicos?’” (Gal. 2,14-21).
São Pedro “não viu, no lance fogoso e inesperado do
Apóstolo das Gentes, um ato de rebeldia, mas de união e amor fraterno. E,
sabendo bem no que era infalível e no que não era, cedeu ante os argumentos de
São Paulo. Os Santos são modelos dos católicos”.3
Humildemente,
São Pedro recebeu a admoestação, reconheceu seu erro e estendeu a mão para São
Paulo, desarmando a todos os que tinham escandalizado com sua conduta.
São Paulo e São
Barnabé permaneceram em Antioquia “com muitos outros”, pregando o Evangelho,
até o dia em que o primeiro propôs ao segundo que voltassem a visitar as
cristandades por eles fundadas (At 15,36).
Surgiu então uma
divergência entre os dois santos: São Barnabé queria levar de novo São Marcos.
Contudo São Paulo se opôs, pois o jovem os havia abandonado sem explicações na
Panfília. “Produziu-se certo dissentimento de sorte que eles se separaram um do
outro” diz São Lucas (At 15,19). São Jerônimo assim comenta: “Paulo, mais
severo, Barnabé, mais clemente. Cada um insiste no seu parecer. Seja como for,
a discussão tem algo da humana fragilidade”.4
São Barnabé
partiu com João Marcos para a Selêucia, e São Paulo, levando consigo Silas, da
igreja de Jerusalém (cf. 1Ped 5, 12), percorreu a Síria e a Cilícia nessa
segunda viagem apostólica (At 15, 40).
O incidente com
São Barnabé foi rapidamente esquecido tanto por São Paulo quanto por São
Marcos. De tal modo que, mais adiante, estão novamente juntos, pois o Apóstolo
escreveu a Timóteo: “Traze-me Marcos contigo, pois ele me é muito útil para o
ministério” (2 Tim, 4,11).
A partir desse
momento, São Barnabé não é mais citado nos Livros Santos, dando lugar a São
Paulo.
Segundo antiga
tradição, São Barnabé morreu em Chipre, em cuja capital (Salamina) seu corpo
foi encontrado no ano de 488. Sua festa comemora-se a 11 de junho.
__________
Notas:
1. Les Petits Bollandistes, Saint
Paul, Apôtre des Gentils et Martyr, Vies des Saints, Bloud et Barral, Paris,
1882, tomo VII, p. 469, nota 1.
2. Holzner, José, San Pablo,
Heraldo de Cristo, Editorial Herder, Barcelona, 1946, p. 128.
3. “A política de distensão do
Vaticano com os governos comunistas. Para a TFP: omitir-se? ou resistir?”, in
“Folha de S. Paulo”, 10-4-1974.
4. Apud Pe. José Leite, Santos de
Cada Dia, Editorial A.O., Braga, 1987, tomo II, p. 230.
(Fonte: site Catolicismo)
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