“Deus
é admirável em seus Santos”! Alguns, inclusive, por causa de costumes e
práticas extraordinários, são mais objetos de admiração do que propriamente de imitação. Esse é o caso de São Simão Estilita, eremita e grande asceta, mais conhecido pelos cristãos da Igreja Ortodoxa bem como pelos Católicos de Rito Oriental.
Simeão Estilita,
o Antigo (Sis, c. 389 - Telnessin, 459) foi um asceta cristão sírio, que viveu no
cimo de uma coluna de pedra. É considerado santo quer pela Igreja Católica
Romana, quer pela Igreja Ortodoxa.
Na Igreja Católica o seu dia corresponde ao 05
de Janeiro, enquanto que na Igreja Ortodoxa é celebrado a 01 de Setembro. É
chamado de "Antigo" para distingui-lo de outro Simeão Estilita que
viveu no século VI. Simeão nasceu no norte da Síria, perto da moderna Alepo,
tendo começado a sua vida como pastor.
Em 403 a.C.
ingressou como monge em Teleda, tendo adoptado práticas de austeridade extremas
que geraram critícas e o afastamento da comunidade. Mudou-se então para Telnessin por volta do
ano 412.
Viveu como
eremita numa cela e depois passou a viver no topo de uma coluna preso
por uma corrente (daí seu apelido estilita, que vem da palavra grega “stylos”,
coluna). Foi adotando cada vez colunas mais elevadas, tendo a última onde
viveria durante trinta anos (entre 429-459) dezessete metros de altura. O que era necessário à sobrevivência era
levado através de uma escada. O local onde se erguia a coluna tornou-se alvo de
peregrinação de doentes e de pessoas que procuravam aconselhamento espiritual.
Simão Estilita
(Séc. V) tornou-se famoso por ter passado 37 anos da sua vida no topo de um
pilar. Daí pregava sermões e escrevia epístolas que eram veneradas em todo o
Império Bizantino.
A fama de Simão
Estilita, que já em vida era considerado um Santo, ficou a dever-se à
autoridade moral que lhe advinha da renúncia ao mundano e da sua dedicação
total à meditação.
Simão, apesar do
exíguo espaço a que se confinou, não viveu isolado. Os seus fiéis seguidores
iam visitá-lo diariamente e Simão exercia daí a sua influência a favor das
causas que considerava justas.
No local do
pilar onde Simão viveu construiu-se mais tarde uma Basílica designada Qal at
Simân (O Palácio de Simão). A ruínas desta Basílica ainda hoje são local de
peregrinação.
A vida de São
Simeão foi escrita por três autores, não somente contemporâneos, senão também
testemunhas oculares da maior parte dos fatos.
São eles: o bispo Teodoreto, que compôs o seu trabalho dezesseis anos
antes da morte de Simeão; Antônio, discípulo do santo, e o sacerdote Cosmas,
seu amigo, que governava uma paróquia das cercanias, e que, em nome de tal
paróquia, lhe escreveu uma carta que ainda possuímos.
Vida, obras e milagres
Nascera Simeão
numa localidade da Cilícia, chamada Sisan, na fronteira da Síria e, desde a
idade de treze anos, guardou ovelhas pertencentes ao pai.
Um dia em que o
rebanho não podia sair em virtude da neve, foi à igreja com os pais e lá ouviu
ler o Evangelho que diz: “Bem-aventurados
os que choram, ai dos que riem; Bem-aventurados os que têm puro coração”.
Perguntou a um
ancião como se podia adquirir tal felicidade. O outro lhe disse que era pelo jejum, pela prece, humildade, pobreza, paciência, e lhe aconselhou a vida
monástica como sendo a mais elevada filosofia.
Tendo recebido
no coração essa semente da palavra divina, Simeão entra numa igreja de
mártires, prostra-se no chão, roga Àquele que quer a salvação de todos os
homens, que o conduza ao caminho da perfeição.
Tendo
permanecido longamente em tal postura, sobrevém-lhe um suave sono durante o
qual tem uma visão que ele soía narrar assim:
“Parecia-me estar cavando um alicerce, e que
alguém me dizia que cavasse mais. Desejando repousar, não podia, porque ele me
ordenava que continuasse a cavar. Assim procedeu quatro vezes. Finalmente, disse-me que o alicerce era
bastante profundo, e que eu podia, sem temor, erguer uma construção da forma e
da altura que me aprouvesse.”
A predição,
observa Teodoreto, foi verificada pelo fato, pois os fatos superam a natureza humana.
Depois dessa advertência interior, entrou Simeão num mosteiro vizinho, e lá
ficou dois anos. Mas o desejo de uma
vida mais perfeita o fez passar a outro, governado por um santo varão chamado
Heliodoro, que para ele entrara com a idade de três anos, transcorrendo
sessenta e dois sem sair.
O mosteiro
contava oitenta monges. Simeão demorou-se dez anos e a todos ultrapassou em
austeridade, pois, enquanto os outros comiam um dia sim, um dia não, ele só comia uma vez por semana. Os superiores o repreendiam, como se se
tratasse de uma irregularidade, mas não conseguiram persuadi-lo, nem
diminuir-lhe o ardor pela penitência.
Um dia, pegando uma corda trançada de folhas
de palmeira e, por conseguinte, duríssima, com ela cingiu o corpo desde os rins
até os ombros, de tal modo que ela lhe entrou na carne.
Levou-a sob o
hábito bastante tempo para que todo o corpo se transformasse em úlcera.
Perceberam-no finalmente pelo cheiro e pelo sangue que dela escorria.
Tiraram-lha com muito esforço; a roupa estava colada à carne pelo sangue; para
arrancá-la, foi mister umedecê-la durante três dias; quanto à corda, houve
necessidade das incisões dos médicos.
A operação lhe
causou dores tão vivas que o julgaram morto durante algum tempo. Quando sarou,
disseram-lhe os superiores que se fosse, de medo que o seu exemplo se tornasse
prejudicial a homens mais fracos que pretendessem imitá-lo. Retirou-se para o
deserto da montanha, e desceu a uma cisterna seca, onde continuou a louvar a
Deus.
Ao cabo de cinco
dias, os superiores, repreendidos por visões, arrependeram-se de o haver repelido,
e mandaram procurá-lo. Encontraram-no e retiram-no da cisterna com uma corda.
Algum tempo depois, rumou ele para Telanissa, localidade situada aos pés de uma
montanha perto de Antioquia.
Numa pequenina
cabana, encerrou-se durante três anos. Quis,
então, imitar o jejum de Moisés e de Elias, e passar quarenta dias sem comer.
O abade Bassus,
superior de um mosteiro vizinho, estava incumbido de inspecionar os sacerdotes
do campo. Simeão rogou-lhe que tapasse a porta com barro, sem lhe deixar nada
na cela. Respondeu-lhe Bassus que
matar-se não era uma virtude, e sim o maior dos crimes. “Meu pai, retrucou-lhe Simeão, deixai-me, então, dez pães e uma jarra de
água; se tiver necessidade de alimento, tê-lo-ei à mão”.
Assim se fez. Ao
cabo de quarenta dias, voltou Bassus, tirou o barro com o qual estava fechada a
porta e, entretanto, viu todos os pães intactos, a jarra ainda cheia de água e
Simeão prostrado, sem voz, sem movimento, sem respiração.
Pedindo uma
esponja, o superior umedeceu-lhe os lábios, e lhe ministrou os divinos
mistérios. Fortalecido, Simeão
levantou-se e tomou algum alimento, isto é, alface, chicória e semelhantes
verduras, que mastigou e engoliu, pouco a pouco. Bassus, arrebatado, regressou
ao seu mosteiro, que contava mais de duzentos monges, e lhes narrou a
maravilha.
Desde então,
continuou o nosso santo a jejuar dessa maneira todos os anos, quarenta dias
seguidos, e já havia transcorrido vinte e oito anos em tal modo, quando
Teodoreto compôs o seu trabalho. Ficava de pé nos primeiros dias, em seguida
sentava-se, continuando a orar, depois estendia-se, semimorto.
Depois de passar
três anos na cela perto de Telanissa, subiu ao tôpo da montanha, e mandou fazer
um cinto de muralhas sem teto, no qual se encerrou, com uma corrente de ferro,
de vinte côvados de comprimento, preza por uma extremidade a uma grande pedra,
e pela outra ao pé direito, a fim de, mesmo que o quisesse, não poder sair
daquele espaço.
Lá,
entretinha-se na meditação das coisas celestes. Melécio, então vigário de
Antioquia, aconselhou-o a tirar a corrente, mostrando-lhe que a vontade bastava
para manter o corpo parado com liames intelectuais. Rendeu-se Simeão e,
mandando chamar um ferreiro, livrou-se da corrente.
Espalhou-se por toda
parte a reputação de Simeão, e todos acorriam a ele, não somente da vizinhança
senão também de lugares distantes vários dias de caminhada. Levavam-lhe
paralíticos, rogavam-lhe que curasse enfermidades. Os que recebiam o que tinham
solicitado voltavam com alegria, e publicavam os benefícios, o que atraía ainda
maior número de pessoas.
Toda espécie de
povos aparecia: ismaelitas, persas, armênios, iberos, homeritas e árabes dos
mais longínquos. Vinham das extremidades
do Ocidente, da Itália, da Gália, da Espanha, da Grã-Bretanha. A reputação do
santo estendia-se até os etíopes e os citas nômades. Em Roma, era tão grande que os artesãos tinham
posto pequeninas imagens do santo na entrada de todas as lojas, para atrair a
sua proteção. Teodoreto afirma que assim ouviu dizer.
Sentia-se Simeão
importunado pela incalculável multidão que se apinhava em volta dele para
tocá-lo e tirar uma bênção das peles que o cobriam.
Parecia-lhe impertinente
submeter-se a tão excessivas honras, e penoso ser constantemente daquela
maneira instado. Foi o que o levou a
ficar de pé numa coluna, em grego style ou
stylos, donde lhe veio o nome de
Estilita.
No ano de 423,
mandou fazer uma de seis côvados de altura, na qual viveu quatro anos.
Mandou erguer
uma de doze côvados, depois outra, de vinte e dois. Ficou treze anos em ambas.
Os últimos vinte e dois anos de vida, passou-os numa quarta coluna de quarenta
côvados de altura.
A coluna terminava com uma balaustrada,
formando um pequeno recinto de três pés de diâmetro.
Foi lá que
Simeão se mantinha de pé, noite e dia, inverno e verão, exposto aos ventos e à
chuva, à neve e à geada.
Os monges do
deserto mandaram perguntar-lhe que modo tão estranho de vida era aquele,
ordenando-lhe que o abandonasse e seguisse o caminho trilhado pelos pais.
Tinham dito ao enviado: “Se ele obedecer de boa vontade, deixai-o viver ao seu modo; ser
resistir e se mostrar escravo da própria vontade, tirai-o da coluna à força.”
O enviado expôs a Simeão a ordem dos Padres, e
Simeão avançou imediatamente um dos pés para descer. O enviado disse-lhe que
permanecesse lá e se animasse, visto que o seu estado vinha de Deus.
Os monges do
Egito, escandalizados com tal novidade, mandaram dizer-lhe que estava
excomungado. Melhor informados, porém, do seu mérito, de novo com ele se
comunicaram.
Estranhava-se
então, e ainda hoje se estranha um gênero tão extraordinário de vida. Pergunta-se
qual a utilidade disso, e quais podem ser os objetivos da Providência.
O padre Cosme,
em particular, nos dá a conhecer a especial vocação de Simeão. Por duas vezes
lhe apareceu o profeta Elias num carro de fogo, e lhe recomendou fortemente
duas coisas, o zelo pela Igreja e a defesa dos pobres.
“Cuida, disse-lhe, de que ninguém despreze o
sacerdócio, e que todos obedeçam aos ministros sagradas. Sobretudo, porém,
cuida dos pobres; saibam os infelizes de toda espécie, os oprimidos, os órfãos
e as viúvas que o teu auxílio jamais lhe faltará, e que serás sempre para eles
pai e defensor. Cuida de jamais cederes às ameaças dos prefeitos e dos reis, ou
de parecer ambicionar o favor dos ricos. Mas repreende com a mesma equidade, e
em público, tanto o rico como o pobre. Sê, pois, firme, e está pronto a tudo
sofrer. Arma-te de paciência e de doçura, a fim de que nunca possa coisa
nenhuma arrancar-te ao dever”.
Depois dessa
advertência celeste, Simeão decuplicou as austeridades.
Durante nove anos, sofreu, entre outras
coisas, de uma horrível úlcera no pé esquerdo.
Todos, os sacerdotes, os bispos e o próprio
imperador, por cartas, lhe rogavam descesse da coluna até que se curasse.
Lá ficou ele,
embora a tal dor se unissem ainda várias outras; e quando, no fim da quaresma,
que ele, como habitualmente, passou sem comer nem beber, julgavam encontrá-lo
morto, viram-no milagrosamente curado; recebeu a comunhão pascal das mãos do
bispo de Antioquia, Domnus, sobrinho e sucessor de João.
Em breve teve o
santo a oportunidade de desempenhar o novo mister.
Trezentos pobres obreiros de Antioquia foram
ao pé da coluna queixar-se do prefeito da cidade. Devia a corporação deles,
todos os anos, tingir de vermelho para a cidade de Antioquia, certo número de
peles.
O prefeito,
varão cruel, teve a triste ideia de exigir três vezes mais. Os obreiros,
vendo-se arruinados por aquele imposto tirânico, sobretudo se se tornasse
perpétuo, enviaram trezentos dos seus a Simeão o qual, comovido, mandou dizer
ao prefeito que não oprimisse os infelizes, e se contentasse com o tributo
comum. Riu-se o prefeito do santo, e ameaçou os obreiros de os fazer apodrecer
no calabouço. Não teve tempo para isso.
Ainda não tinha os trezentos legados saído do
recinto de Simeão, quando alguém trouxe a notícia de que o prefeito, atacado de
súbita hidropisia, rolava pelo chão torturado por espantosas dores; chegaram
imediatamente cartas em que se rogava ao servidor de Deus que dele se
apiedasse; finalmente, todos os sacerdotes do seu governo rumaram para o pé da
coluna pedindo ao santo que lhe devolvesse a saúde.
Respondeu Simeão
que era preciso deixar a questão a Deus; ao mesmo tempo, benzendo um pouco de
água, disse: Se Deus prevê que esse homem, uma vez curado, se há de portar
melhor, desde que o molhem com esta água, sentirá a graça de Jesus Cristo; mas
se Deus prevê o contrário, eu vos predigo, o enfermo não verá absolutamente
esta água.
Um mensageiro, imediatamente enviado, envidou
todos os esforços; mal, porém, entrou na casa, soube que o prefeito acabava de
expirar no meio de espantosas convulsões. O exemplo espalhou um salutar terror
entre os maus, e reanimou a esperança dos oprimidos .
Uma rainha de
árabes tinha um ministro que tiranizava viúvas e órfãos, bem como o país
inteiro.
Os habitantes
enviaram legados a Simeão, que mandou dizer ao cruel ministro: Cuida de te
corrigir dos crimes de que te acusam, para que, roubando o bem alheio, o teu
não percas. Mas o homem, longe de aquiescer a tal censura, maltratou o enviado
que lha transmitira.
O castigo não
tardou. Nem ainda partira o legado, quando o ministro caiu como que
petrificado, e morreu dizendo: Simeão, por favor, tende piedade de mim .
Entretanto,
foram contar a Simeão que inúmeras pessoas se queixavam das suas advertências e
das suas importunas intercessões nas causas de viúvas, órfãos e outros
desventurados.
Tratava-se de criaturas que, pouco temendo os
juízos de Deus, oprimiam o povo. Resolveu ele, então, nada mais fazer, e deixar
tudo à Providência; proibiu aos discípulos que admitissem queixosos ao seu
recinto, pelo menos até que lhe fosse dado conhecer de maneira mais precisa a
vontade de Deus. Vários foram, pois, obrigados a voltar tristemente.
Não tardou o
nosso santo em ter uma visão, na qual foi severamente repreendido pela
fraqueza, e ameaçado de ver passar a outro a vocação e autoridade; a fim de
reparar o erro, foi-lhe ordenado fazer o possível para a defesa dos pobres e
aflitos, e deixar o resultado a Deus.
Pouco depois,
dois irmãos, ainda moços, chegaram de Antioquia para lhe rogar proteção contra
o conde de Oriente, crudelíssimo varão, que os perseguia em virtude de uma
velha inimizade como o pai deles que morrera.
Simeão, que fora
amigo do pai, admoestou o conde nestes termos: “Não façais mal nenhum a estes rapazes, pois me pertencem.”
Respondeu o conde que, longe de lhes querer mal, estava pronto a prestar a ele,
com os dois rapazes, os mais humildes serviços. Era um gracejo.
Aproximava-se a
quaresma, em que Simeão não admitia ninguém ao seu recinto. Tendo os jovens
regressado à cidade, o conde mandou prendê-los, ameaçou-os de prisão se se não
submetessem a todas as suas exigências, e de tudo informou zombeteiramente o
santo, mediante uma carta.
Respondeu-lhe
Simeão estas palavras: “Advirto-vos pela
segunda vez; não façais o menor mal a estes rapazes, para que não suceda sejais
vós próprio levado perante a justiça, sem terdes a quem recorrer”!
Replicou o
conde: “Sei que, durante estes quarenta dias, fechais o vosso recinto, para
passá-los no retiro. Far-me-eis, pois, o favor de empregar todo esse tempo em
me desejar o mal, pois se me desejardes o bem, não quero me sobrevenha. Simeão
disse: “Infeliz”! Desejou a maldição em
vez da benção. Deus há de ouvi-lo antes que ele pensa.”
No terceiro dia
da primeira semana do jejum, dois dias depois de se haver Simeão encerrado,
atravessava o conde, num carro, a praça pública, quando subitamente o detiveram
cinco oficiais do palácio.
Com uma corda ao
pescoço foi levado ao tribunal, onde numerosos acusadores exigiam vingança
pelas suas inúmeras iniquidades. O mestre da cavalaria, que recebera as ordens
secretas do imperador, condenou-o a uma grande multa e mandou que o atirassem
ao calabouço.
O homem, então,
suplicou humildemente aos dois jovens que por ele intercedessem com Simeão, e
obtivessem missivas ao imperador. Responderam-lhe os dois que era precisamente
o tempo em que o santo não recebia ninguém; que, a não ser tal, trataria indubitavelmente
da sua questão com o imperador e os prefeitos do pretório. Abandonado por
todos, foi o infeliz ignominiosamente conduzido por todas as cidades até
Constantinopla, onde o imperador o privou de todos os bens e o condenou ao
exílio.
Não chegou sequer ao lugar de exílio, uma vez
que morreu miseramente em caminho .
Após semelhantes
fatos, a acorrência de infelizes de toda espécie tornou-se prodigiosa.
Reclamava-se a
intercessão do santo, não somente contra a injustiça dos homens, senão também
contra toda espécie de calamidades. Assim, o território de Afsão foi devastado
por uma multidão de ratos que atacavam os próprios animais, e os habitantes não
tiveram dúvida em recorrer a Simeão.
Mostrou-lhes ele, em primeiro lugar, que se
tratava de um castigo pelos pecados cometidos; depois, ordenou-lhes que lhe
levassem ao pé da coluna um pouco de pó, com ele fizessem três cruzes em cada
casa, e uma nos quatro cantos da cidade, celebrassem as vigílias, com o santo
sacrifício, durante três dias, e abrandassem a Deus mediante orações.
Obedeceram-lhe e no terceiro dia não se viu
mais um sequer dos inúmeros bichos .
No meio da
multidão de homens que afluíam de toda parte, Simeão era sempre um apóstolo no
trono, a pregar constantemente tanto para os cristãos como para os pagãos.
Aos primeiros,
lembrava a perfeição do Evangelho, com os meios de correção dos defeitos.
Assim, para desabituá-los de jurar pelo nome de Deus, pedia-lhes jurassem pelo
seu.
Várias vezes, em
seguida às suas exortações, uma paróquia, uma localidade inteira, empenhava-se
por escrito em ser fiel ao trato. Vimos um exemplo na carta que lhe escreveu a
localidade de Fanir.
Está em nome do
sacerdote Cosme, dos diáconos, dos leitores e de todo o povo, com os seus
magistrados; todos, unanimemente, subscrevem aos preceitos que ele lhes impôs:
santificar o domingo e a sexta-feira, não ter duas medidas, mas apenas uma,
justa, não deixar ultrapassar os limites do seu campo, não recusar o salário
aos obreiros, reduzir à metade o juro do empréstimo, devolver os penhores aos
que pagam, julgar, segundo a equidade, a causa dos pequenos e dos grandes, não
ter nenhuma deferência com a justiça, e não receber presentes contra quem quer
que seja, não caluniar ninguém, não manter relações com malfeitores e ladrões,
reprimir os desdenhadores das leis, de frequentar assiduamente a igreja. Seja
anatemizado quem violar essas regras, quem se apoderar do bem alheio, oprimir
os inocentes, subornar os juízes, tirar qualquer coisa aos órfãos, às viúvas,
aos pobres, ou raptar mulher. Pois tudo quanto nos prescrevestes, e que nós
ratificamos, queremos seja observado no futuro. E o que prometemos, juramos
cumprir, juramo-lo por Deus, por Cristo e pelo Espírito vivificante e
santificante, e pela vitória dos nossos imperadores. Se alguém ousar
desobedecer, seja anatemizado segundo a vossa palavra; nós o repreenderemos,
não teremos ligação com ele, a igreja não lhe receberá a oferta, não
assistiremos ao sepultamento dos seus .
Vê-se por esse
exemplo a salutar influência de Simeão nos contemporâneos. O padre Cosme, que
lhe dirigiu a carta assinada por todos é o mesmo que lhe escreveu a vida.
Pelas suas pregações e pelos seus milagres,
convertia Simeão particularmente milhares e milhares de infiéis: iberos,
armênios, persas, árabes, especialmente árabes ismaelitas.
Iam vê-lo em
grandes grupos de duzentos ou trezentos, às vezes de mil, renunciavam em voz
alta aos erros dos antepassados, particularmente ao culto de Vênus, e quebravam
os ídolos na sua presença; recebiam o batismo, e aprendiam dos seus lábios as
leis segundo as quais deviam viver.
O biso Teodoreto
assistiu um dia à conversão de um grupo de ismaelitas. Quase foi sufocado até,
pois tendo Simeão dito que fôssem pedir-lhe benção episcopal, acudiram os
ismaelitas com selvagem afoitamento; uns o puxavam pela frente, outros por
trás, outros pelos lados; os mais afastados, montando nos outros, alongavam os
braços, pegavam-no pela barba ou pelas vestes; ia ser esmagado, quando Simeão
gritando, os afastou .
Muitas vezes, ao
pé da coluna, os credores perdoavam as dívidas aos devedores, os amos
libertavam gratuitamente os escravos.
Quando, no fim
da quaresma, se reabriram as portas do seu recinto, não somente a montanha de
Telanissa, senão também as montanhas das cercanias fervilhavam de gente.
Vê-lo de longe
bastava a grande número de pecadores e pecadoras para abraçarem a penitência e
retirarem-se em mosteiros. Invocavam-no, tanto ausente como presente. Os
marujos iam agradecer-lhe havê-los socorrido na tormenta e salvado do naufrágio
.
Os cristãos da
Pérsia lhe enviavam cartas e legados para agradecer-lhe haver libertado da
prisão trezentos e cinquenta deles, e feito cessar a perseguição com o trágico
fim do mago que a instigara .
O próprio rei da
Pérsia concebeu pelo santo a mais elevada estima. A uns legados que lhe falavam
do santo, perguntou como vivia este e quais eram seus milagres.
A rainha, sua esposa,
pediu azeite abençoado por Simeão e o recebeu como grande presente. Todos os cortesãos,
apesar das calúnias dos magos, cuidavam de se instruir com ele, e lhe chamavam
varão divino.
No meio dessa
glória, era ele tão humilde que se julgava o último dos homens.
De fácil acesso,
doce e agradável, respondia a todos, fosse artesão, camponês, mendigo.
Dizia aos que
libertara suas enfermidades: “Se alguém
vos perguntar que vos curou, dizei que foi Deus; guardai-vos de falar de
Simeão, pois recaireis no vosso mal”.
Teodoreto, que o
vira e com ele conversara várias vezes, e que lhe escreveu o resumo da vida,
bem via a dificuldade de acreditar em tais maravilhas.
É por isso que
diz: “Ainda que eu disponha por testemunhas, se assim devo falar, de todos os
homens vivos, temo que a minha narração pareça à posteridade uma fábula
inteiramente destituída de verdade. O que aqui se passa está acima da
humanidade; entretanto, costumam os homens medir o que lhes diz pelas forças da
natureza, e quando alguma coisa lhe ultrapassa os limites, afigura-se mentira
aos que desconhecem as coisas divinas” .
No ano de 459,
sofreu a cidade de Antioquia espantoso desastre.
Foi, na
narrativa de uma testemunha ocular, durante a noite de 7 para 8 de junho,
durante a noite do domingo de Pentecostes para a segunda-feira .
O povo acabava
de se entregar a tais desordens e brutalidades que superavam em muito a
ferocidade das feras, segundo a expressão de Evagro.
De súbito, pelas
quatro horas da noite, verificava-se um tremor de terra tão furioso que fez
desabar quase toda a cidade, e sobretudo a parte mais rica e povoada.
Várias
localidades dos arredores tiveram a mesma sorte.
O refúgio dos infelizes, na época, era o grande
Simeão Estilita.
Viu êste chegar ao pé da sua coluna uma
multidão em pranto, sacerdotes e leigos, trazendo grandes cruzes, archotes e
incensórios fumegantes.
A afluência
durou cinquenta e um dias. Era tão grande o terror que ninguém ousava entrar
nas casas nem trabalhar nos campos. Por toda parte se ouviam gritos e gemidos.
A única
esperança da turba era Simeão. Estava pronta para tudo quanto ele ordenasse.
Após os cinquenta
e um dias de luto, houve, no mês de julho, uma grande solenidade, a última do
bem-aventurado Simeão. Não creio, diz o autor da sua vida, testemunha ocular,
que jamais tenha havido reunião tão numerosa; era como se Deus tivesse
arrancado dos seus países todos os povos do universo para os reunir num mesmo
lugar, a fim de dizer o derradeiro adeus ao seu amado servidor.
Ele, como pai
que dita as últimas vontades a filhos dóceis, tendo mandado chamar os
sacerdotes e o povo, consolou-os a princípio, e em seguida os exortou muito a
observar os mandamentos de Deus. Acrescentou, então:
“Agora,
voltai para vossos lares, e celebrai vigílias cristãs durante três dias;
depois, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, ide, sem temor, cuidar dos vossos
afazeres, e retomem os artesãos o seu respectivo trabalho; tenho a certeza de
que Deus se apiedará de vós no futuro.” Disse, e a todos despediu.
Trinta dias
depois da partida deles, em 29 de agosto, um sábado, às onze horas, na presença
de alguns dos seus discípulos, o servidor de Deus foi repentinamente atacado de
um mal que, alastrando-se-lhe pelo corpo todo, em breve se fez mortal.
Do domingo à terça-feira, o seu estado foi,
pouco mais ou menos, o mesmo.
Entretanto,
emanava-se-lhe do corpo uma suavidade e uma variedade de odores incomparáveis.
Finalmente, na
quarta-feira, 2 de setembro, às nove horas, estando presentes todos os discípulos,
prepôs dois deles aos demais, e recomendou todos ao Senhor.
Em seguida,
ajoelhou-se três vezes e, depois de se levantar, olhou para o céu. Gritando-lhe
de todos os lados a multidão: “Abençoai-nos,
Senhor!” Ele volveu o olhar para as
quatro partes do mundo, e, erguendo a mão, o abençoou e o recomendou ao Senhor
por três vezes; depois, erguendo de novo os olhos ao céu e batendo três vezes
no peito, pousou a cabeça no ombro do primeiro discípulo e expirou.
A multidão
continuava a lhe contemplar o rosto, sem saber se estava vivo ou morto.
Um dos discípulos valeu-se do tempo e daquela
incerteza, para mandar avisar às ocultas o bispo de Antioquia.
Temia-se que o
povo lhe raptasse o corpo. Pelo mesmo motivo, os discípulos não o baixaram da
coluna para colocá-lo no relicário; pelo contrário, mostraram o relicário sobre
a própria coluna, aguardando o dia do funeral.
A nova da sua
morte divulgou-se imediatamente por todo o mundo. Houve, ao mesmo tempo, luto e
júbilo.
Os órfãos e as
viúvas perguntavam, entre lágrimas e soluços:
Aonde iremos
encontrar-vos agora, Simeão, vós que, após Deus, foste a nossa única esperança?
Os que se viam oprimidos pelos poderosos e privados dos seus bens exclamavam
com amargura: nós, os mais infelizes dentre os mortais, agora é que iremos
temer a cólera e a cobiça dos lobos!
Como livrar-nos
de tais angústias? Que auxílio invocaremos? Ah, quem despertará do sono êste
leão cuja voz formidável fazia tremer todos os animais ferozes? Os enfermos
diziam, chorando: aonde poderemos ir, encontrar um médico igual a vós, Simeão,
vós que expulsáveis a enfermidade antes de ver o enfermo?
O clero o
lamentava como firme sustentáculo da fé e da disciplina.
Ao mesmo tempo,
todos se alegravam, refletindo que, após uma vida tão santa, fora coroado no
céu.
No seu funeral,
houve incontável multidão. O patriarca na Antioquia, Martírio, apareceu com
vários bispos.
Ardaburo, que
governava o Oriente com um poder quase soberano, também apareceu com vinte e um
condes, um grande número de tribunos ou generais, seguidos das tropas romanas.
Os habitantes de
Antioquia tinham lhe pedido a honra de conservar na cidade as relíquias do
santo, para lhes substituírem as muralhas que haviam desabado.
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Ruínas (o que restou) da coluna onde viveu São Simão Estilita. |
Foi com tal
pompa que o corpo foi transportado, a princípio pelos sacerdotes e bispos,
desde o recinto da coluna até a primeira aldeia, pelo espaço de quatro milhas;
em seguida, puseram-no num carro escoltado por guardas de honras, pelos
príncipes, por todos os magistrados da cidade, pelas tropas romanas e por uma
multidão sem fim de povo.
Ao canto dos
hinos, ao esplendor dos archotes, misturava-se o perfume que ardia à passagem
do cortejo. Homens e mulheres, anciãos e moços, plebeus e nobres, desertavam as
cidades para venerar as relíquias do santo, e receber dele a sua derradeira
bênção.
O cortejo durou
cinco dias, sendo a distância de quinze léguas. Na segunda-feira, tiraram-no do
recinto, na sexta-feira entrou em Antioquia, onde o corpo foi depositado na
grande igreja.
Um energúmeno,
que fora curado durante a passagem do corpo, o acompanhou até lá. O patriarca e
o seu clero instituíram um ofício cotidiano em sua honra.
Verificaram-se
ainda mais milagres no seu túmulo do que os realizados durante o tempo em que
vivera.