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Encontre o (a) Santo (a), Beato (a), Venerável ou Servo (a) de Deus

domingo, 24 de junho de 2018

Beata Maria Felícia de Jesus Sacramentado, Virgem da Ordem Carmelita Descalça, primeira Beata do Paraguai.


Maria Felícia Guggiari Echeverría nasceu a 12 de Janeiro de 1925 em Villarrica del Espíritu Santo, no Paraguai, sendo a primogênita de sete filhos do casal Ramón Guggiari e Maria Arminda Guggiari Echeverría. Foi batizada, somente, no dia 28 de Março de 1928, contava já três anos e dois meses, juntamente com os seus irmãos Maria Teresa (Manhica) e Frederico (Freddy), na Catedral de Villarica. Os seus padrinhos foram Luís Rufinelly e Maria Arminda Guggiari.

Era fisicamente pequena, motivo pelo qual o seu pai apelidou-a de “Chiquitunga” (pequerrucha, em guarani). Foi dotada de esplêndidas qualidades humanas e espirituais. Era muito alegre, sociável, prestável, modesta e muito simples.

 Aos cinco anos ingressou no Colégio “Maria Auxiliadora”. Desta época, conta-nos a sua mãe a seguinte anedota: “Num dia de muito frio, Chiquitunga voltou da escola tiritando de frio porque tinha dado o seu casaco a uma menina pobre. Uma das suas irmãs denunciou-a ao pai, porém ela respondeu: ‘Estás a ver, paizinho! Eu não sinto frio!’ E repetia esfregando as mãozinhas pelos braços nus e tiritantes”.  Episódio significativo que revela o caráter desta menina que encontrava a sua felicidade na partilha com os outros. O amor dá e dá-se.

O seu pai, homem reto, honesto, bom e de carácter irrepreensível, não era muito ligado à religião e à Igreja, embora grande respeitador. A sua mãe, mulher cristã, forte e firme, de grandes valores morais, soube como ninguém educar os seus filhos, preparando-os para serem na vida exemplos de coerência. Chiquitunga teve uma boa família e uma boa educação.



O lindo e característico sorriso de Chiquitunga: uma alma pura
e cheia de amor por Deus e pelo próximo


       A sua formação religiosa e espiritual foi solidificada no colégio católico que frequentou, sob a orientação das religiosas, chamando à atenção, desde pequenina, pela sua piedade. A 08 de Dezembro de 1932, recebeu pela primeira vez Jesus Eucaristia na Catedral de Villarrica,. Deste dia recordará anos mais tarde: «Nunca se apagará da minha mente a lembrança do dia mais feliz da minha vida, o dia da primeira união com o meu Deus e o ponto de onde surge minha resolução de ser cada dia e melhor».

Em 1937 iniciou os estudos liceais na Escola Normal nº 2 “Manuel Gondra”. Ingressou na Ação Católica em 1941. Em 1942 obteve o título de Mestra Nacional. Recebeu o Sacramento da Confirmação na Catedral de Villarica em 1945.

Na Ação Católica, Chiquitunga encontrou um ideal e um objetivo que orientou toda a sua vida, tendo trabalhado, com dedicação e amor, incansavelmente, num apostolado ativo e abrangente. Fez uma verdadeira consagração da sua vida, do seu ser, do seu tempo, ao apostolado: “Não quero passar agora adiante sem relembrar que hoje completo 10anos, senão me falha a memória, da minha ‘Consagração ao Apostolado’, a graça que, depois do Batismo e da Eucaristia, é a maior e a mais sublime com que Deus me presenteou”. Uma alma de fogo que ateava outros fogos.



Maria Felícia, a "Chiquitunga", desde pequena sempre foi uma alma que manifestava
uma vida interior profunda, marcada por ardente amor a Deus. 

Seu coração estava aberto a todos os necessitados material ou espiritualmente: idosos, doentes, abandonados, presos, marginalizados pela sociedade: «Eu vi-me mais de uma vez a andar tranquila, percorrendo lares, prodigando nem que seja um sorriso como fruto espontâneo da graça palpitante nas nossas almas... Ser apóstolos, Senhor, que lindo sonho!»

O ideal que a animava: o intenso apostolado, o fazer o bem tinha origem no seu profundo amor por Jesus Cristo, a quem se decidiu entregar, sem meias medidas, no estado de vida que Ele quisesse. O seu amor por Ele, cultivado na intimidade da oração e na participação diária na Eucaristia, constituía o centro da sua vida espiritual: «Hoje, no entanto, renovo perante Ti, Jesus Hóstia, este desejo sincero e íntimo de imolar a minha vida em prol do Teu amor». A Virgem Maria ocupava um lugar muito importante na vida de Chiquitunga. Chamava-a de “Minha Mãezinha”: «Somente quero pertencer-te, Mãezinha, para que Tu, tomando-me pelas mãos, como a uma pequenina, me leves a Ele, o único, o exclusivo amor do meu coração».

O seu lema de vida: “TUDO TE OFEREÇO, SENHOR”, que ela representava como “T2OS”, qual “forma química” para a felicidade, sintetiza a sua vida de entrega a Deus, numa consagração total do seu ser a Jesus Cristo, Seu Filho diletíssimo, deixando-se guiar pelo Espírito Santo, a fim de cumprir sempre a Sua santa vontade. O seu ideal está sintetizado na seguinte poesia que ela escreveu: “TUDO TE OFEREÇO, SENHOR… Tudo te ofereço, Senhor, tudo quanto há em mim: as alegrias da minh’alma, as agonias sem fim. Tudo te ofereço, Senhor: meus trabalhos, meus pesares, as notas dos meus cantares que de sempre elevo para Ti. Tudo quanto há em mim, tudo te ofereço, Senhor, para que se faça em mim o que te agradar, meu Deus. Toda inteira e sem reserva, faz que eu chegue a subir, para estar contigo sempre mesmo que custe ‘morrer’”.

Quando, em fevereiro de 1950, se transladou com a sua família para Assunção, fez sem tardar três coisas: continuar a estudar para obter o grau de professora, procurar emprego com o qual pudesse ajudar a família e incorporar-se na Ação Católica da capital. Ingressou na Escola Normal nº1 de Professores e entre 1951 e 1952 exerceu o magistério na Escola paroquial dos Padres Redentoristas.

Em 1950, Maria Felícia conheceu Ángel Sauá Llanes, um jovem estudante de medicina e dirigente da Ação Católica e foi tal a comunhão de almas, partilhando o mesmo ideal, que surgiu entre eles uma profunda amizade e um amor pleno e puro. A partir de então passavam os domingos juntos visitando os pobres. Chiquitunga sentia um apelo para se consagrar totalmente a Deus, mas conhecendo este jovem, ela mesma pensou se Deus a chamaria ao matrimônio. Tendo falado com o seu diretor espiritual, e com o seu aval seguiu em paz.

O natural teria sido que a amizade entre os dois jovens, com aquele amor tão puro, tal como pensavam as suas famílias, acabasse em casamento, porém não foi assim. Ángel partilhou com Chiquitunga a sua determinação de seguir o sacerdócio assim que terminasse os seus estudos em Madrid. Ela compreendeu perfeitamente, aceitou e apoiou-o incondicionalmente. Estava pronta a abdicar daquele amor, por um Amor maior, por Aquele que é capaz de preencher todas as fibras do coração humano com ondas de felicidade eterna. Num ato de heroísmo sem igual, separam-se, empreendendo ele o caminho do sacerdócio e ela o da vida religiosa. No seu diário escreveu: “Muitas vezes tinha concebido isto que agora, Senhor, é maravilhosa realidade: Que lindo seria ter um amor, renunciar a esse amor e juntos imolá-lo ao Senhor em prol do ideal”.

Dr. Ángel Sauá Llanes, mora, 
desde a década de 60 em Roma.
Concluiu medicina em Madrid. 
Especializou-se em psiquiatria.
Casou-se. É médico e escritor. 
Um amor que foi sublimado em prol de um amor maior. E não se pense que seguiram a vida religiosa por desgosto, pois a sua decisão foi consciente, de comum acordo e em ambos os casos trouxe-lhes paz e felicidade, mesmo com sofrimentos, pois não eram insensíveis um ao outro. Que nobreza e que coragem a destes jovens na sua fidelidade de seguirem o chamamento de Deus! Sauá escreveu posteriormente: “a nossa relação se sublimou num verdadeiro amor místico, privado de toda a componente erótica e, conscientemente, concordamos em apresentar a nossa situação no ambiente familiar e social que nos rodeava, como se fosse uma normal relação sentimental entre dois jovens da nossa idade. Assim, por exemplo, uma vez, depois de termos doado o nosso sangue para uma intervenção cirúrgica de uma doente cancerosa, a Chiquitunga escreveu-me uma comovedora carta, na qual dizia que o nosso sangue que devia misturar-se nas veias de um filho, havia-se misturado no coração dum pobre”.

Na véspera da partida de Sauá para Madrid, fizeram diante de Deus o compromisso de separação. Como lembrança, Chiquitunga deu a Ángel um desenho dela mesma abraçada à Cruz, entregando-o a Jesus para ser um santo sacerdote. Ele, por sua vez, ofereceu-lhe uma pulseira de prata com o nome de Mieke que era o nome carinhoso com que ele a tratava. Maria Felícia, no seu desejo de viver o lema da sua vida: “tudo Te ofereço, Senhor”, começou a indagar-se onde se encontraria o lugar onde poderia realizar essa entrega total da sua vida:


Vestida de noiva, no dia da 

tomada de hábito. 
«Neste momento, em que como nunca, com um ardor inigualável, quisera dar-me, sem medida, Jesus, Mestre amado, Esposo da minha alma. Tu que conheces as minhas ânsias de apostolado, de zelo pela salvação das almas, ajuda-me: que eu saiba onde queres que eu consagre integralmente todo o meu ser!... Por um lado, está a ânsia de entregar-me, em corpo e alma, ao Divino Esposo num convento, onde sem cessar, possa louvá-Lo, reverenciá-Lo e servi-Lo... e, por outro lado, a necessidade do apostolado leigo: estar em todos os ambientes e a todo o momento.»

O Senhor foi guiando-a na sua busca. No dia 20 de agosto de 1952, deu-se um encontro providencial entre Maria Felícia e a Madre Teresa Margarida, prioresa das Carmelitas Descalças de Assunção, no Hospital Espanhol, onde esta se encontrava hospitalizada. Tinham-lhe sugerido, ela hesitou, mas, lá acabou por ir. No seu diário escreveu: «Francamente eu não queria ir, mas Deus ajeitou tudo e, graças a isso, hoje conto com uma mãe».


Chiquitunga no dia da "tomada de hábito", 

ou, vestição religiosa, que marca o início do

noviciado no Carmelo Descalço. 
A madre teve a oportunidade de conhecê-la e acompanhá-la no momento de dúvidas pelo qual ela estava a passar. No mês de janeiro de 1954, saiu dum retiro resolvida a entregar-se inteiramente a Deus como carmelita descalça. Na manhã do dia 02 de fevereiro de 1955, Festa da Apresentação do Senhor, repleta de fervor, ingressou no mosteiro das carmelitas descalças de Assunção. Chiquitunga escreve: “Fazem exatamente 18 dias de constantes e ininterruptas horas de gozo neste santo Carmelo, no qual Deus nosso Senhor, com infinita misericórdia, me elegeu, e tremo, de verdade, ao dizer esta palavra, conhecendo-me ruim e pecadora como sou”. Terminado o período de postulantado, no dia 14 de agosto de 1955, teve lugar a cerimónia da sua tomada de hábito. Revestida do seu vestido de noiva, desposou-se com Jesus, recebendo o hábito carmelita e o nome de Irmã Maria Felícia de Jesus Sacramentado.


Beata Maria Felícia de Jesus Sacramentado, 
no dia de sua "profissão" simples, 
ou, votos temporários. 
A sua Profissão simples teve lugar no dia 15 de Agosto de 1956, fazendo os seus votos temporários, por três anos, nas mãos da Madre Teresa Margarida do Sagrado Coração. A Madre Teresa Margarida resumiu em poucas palavras a atitudes da Irmã Felícia desde o início da sua entrada no Carmelo: “grande espírito de sacrifício, caridade e generosidade, tudo envolvido em grande mansidão e comunicativa alegria, sempre viva e brincalhona». Na sua vocação contemplativa do Camelo oferecia-se pelos sacerdotes. “Cantinho alegre, pedaço do céu, cela do Carmelo quero em ti morrer. Dizem que o silêncio é de Deus morada, quando acompanhado vai de soledade: silêncio na mente, silêncio nos lábios, soledade do mundo, de homens soledade”.




Aproxima-se o momento de encontrar o Amado face a face...

No dia 9 de janeiro de 1959 foi internada no Hospital da Cruz Vermelha, por se encontrar doente com uma hepatite infeciosa. De lá escreveu: “Já espero por Jesus. Queria encher-me somente do Seu amor e não viver senão para Ele. Só desejo cumprir a Sua vontade, não quero outra coisa...”.

Nesse mesmo mês, a sua irmã Manhica morreu com a mesma doença. No dia 22 de março teve alta e pôde voltar para o mosteiro. Porém, no dia 26, domingo de Páscoa, o seu irmão Frederico (Freddy), médico, diagnosticou-lhe “púrpura” e foi novamente hospitalizada.

Na madrugada do dia 28 de abril de 1959, acompanhada pela prioresa, pela família e sobretudo pelo irmão médico que cuidou permanentemente dela, estando iminente o fim, a Irmã Felícia pediu que lhe lessem o poema “Morro, porque não morro”, de Santa Teresa de Jesus. Recostada nas almofadas parecia dormir. Mas, de repente, ergueu-se com uma energia fora do comum exclamando: “Paizinho querido, que feliz eu sou! Que grande é a religião católica! Que dita o encontro com o meu Jesus! Sou muito feliz!” E sem desaparecer o seu sorriso balbuciou: “Jesus eu Te amo! Que doce encontro! Virgem Maria!”.  E entregou a sua alma ao Criador. Eram 4 horas e 10 minutos. Chiquitunga tinha, então, 34 anos de idade. As exéquias foram uma manifestação espontânea, e, em boa parte, inesperada, da sua fama de santidade. O comentário que se ouvia entre as pessoas era: “morreu uma santa”.

No dia 30 de maio de 1997 o arcebispo de Assunção, Dom Felipe Santiago Benítez, solicitou a introdução da causa de canonização da Irmã Felícia. A 13 de dezembro de 1997 deu-se a abertura do Processo Diocesano em Assunção. Por ocasião do reconhecimento canônico dos restos mortais de Chiquitunga, observou-se que dentro do crânio havia "algo" solto. Ao ser aberto, para espanto dos presentes, foi encontrando seu cérebro incorrupto. Estava como que "desidratado", de coloração marrom escura, reduzido de tamanho, mas, conservava ainda anatomia perfeitamente perceptível. Sendo, posteriormente, colocado à veneração em um relicário. 










        No dia 28 de abril de 2000, foi concluído o Processo Diocesano que foi enviado para Roma no dia 8 de maio de 2000 e entregue à Congregação para a causa dos Santos no dia 10 de maio. No dia 22 de fevereiro de 2002 foi assinado o Decreto de Validade do Processo Diocesano e foi nomeado um Relator.

No dia 6 de março de 2018 o Papa Francisco autorizou a publicação do decreto do milagre para a beatificação. O milagre para a beatificação ocorreu no dia 15 de agosto de 2002. As testemunhas contam o fato ocorrido com o pequeno Ángel Domínguez quem nasceu morto e, sem intervenção médica alguma, ressuscitou através de um milagre obtido pela intercessão de Chiquitunga, a pedido de uma enfermeira presente no momento que a criança nasceu morta.

Maria Felícia de Jesus Sacramentado, a primeira Beata paraguaia, foi solenemente beatificada no estádio Pablo Rojas no dia 23 de junho de 2018, em belíssima e participadíssima Missa, com a presença de 60.000 fiéis, transmitida pela televisão e pela internet para todo o mundo. 





Os restos mortais da Irmã Maria Felícia foram levados pelo Frei Romano Gambalunga, postulador geral dos Carmelitas Descalços, para o Vaticano, para estudo e conservação e regressaram ao Paraguai para a beatificação.

Aquela que foi carinhosamente apelidada de Chiquitunga, pela sua pequena estatura, vai receber a maior honra humana: o reconhecimento da sua santidade que revela a grandiosidade da sua alma. Chiquitunga, roga por nós!

Oração para dar graças a Deus pela beatificação de Chiquitunga e para impetrar-lhe a intercessão:
Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, que Vos alegrais em fazer a Vossa morada no coração dos homens: nós Vos damos graças por terdes derramado na Beata Maria Felícia de Jesus Sacramentado o fogo do Vosso amor, levando-a a doar sua juventude no apostolado laical e a imolar-se por todos na vida contemplativa do Carmelo.

Nós Vos louvamos e bendizemos, porque, com a sua vida exemplar, nos manifestais a Vossa bondade de Pai e Amigo e nos revelais as exigências do verdadeiro amor. Pedimos-vos que nos concedais por sua intercessão a graça que Vos suplicamos, se for para Vossa maior glória e bem das almas. Amém.



Nota: 
O texto acima foi fruto de revisão, adaptação e complementação de um texto básico, em forma de "apresentação de slides" em Power Point, feito por Antônio José Gomes Machado, ocds, da Comunidade Stella Maris do Carmelo Secular do Porto, Portugal. Foram feitos por mim vários acréscimos ao texto base... 




terça-feira, 19 de junho de 2018

Beatos Sebastião Newdigate, Walter Pierson, Guilherme Exmew, João Houghton e companheiros, monges cartuxos e mártires (perseguição na Inglaterra).


Beato Sebastião Newdigate













Dezoito monges cartuxos de Londres morreram mártires entre 1535 e 1537, durante a perseguição desencadeada pelo rei Henrique VIII da Inglaterra após o cisma. Por se recusarem a repudiar a autoridade do papa, os monges Guilherme Exmew, João Houghton, Onofre Middlemore, Sebastião Newdigate e seus companheiros foram presos, torturados e finalmente, em 19 de junho de 1535, martirizados. O papa Leão XIII os beatificou em 09 de dezembro de 1886 junto com outros mártires da mesma perseguição.


Na grande perseguição dos católicos, decretado pelo rei Henrique VIII na Inglaterra, em cada Ordem religiosa, juntamente com o clero diocesano, ele deixou um saldo de sangue e martírio em defesa da Igreja e da Fé Católica. Todos lembram, pelos livros de história o que houve naqueles tempos: o rei, querendo divorciar-se de sua legítima esposa, a rainha Catarina de Aragão, para casar-se com sua amante, Ana Bolena, exigiu do papa da época, Clemente VII, que o mesmo legitimasse seu intento. Como o papa recusou-se terminantemente a fazer tal absurdo, até porque contraria à santíssima Lei de Deus, o rei, irado e rancoroso, resolveu romper com a Igreja Católica e ordenou que todo o reino o fizesse, fundando a chamada “igreja da Inglaterra” ou “igreja anglicana”. As primeiras vítimas de seu ódio ao papa e à Igreja Católica foram seu próprio primeiro ministro, Tomás More, e o arcebispo de Canterburry, João Fisher, que foram condenados à decapitação em praça pública e martirizados.
Mesmo os cartuxos, por serem monges, portanto, não dedicados a qualquer atividade política, contribuíram para esse testemunho da Igreja Católica pelo martírio. Os monges da Cartuxa de Londres também receberam a visita dos funcionários do rei que de acordo com o decreto, exigiam a todos os adultos, inclusive aos clérigos e religiosos, que aprovassem o repúdio à determinação do papa, aceitassem o divórcio do rei com sua esposa, a rainha Catarina de Aragão e depois a aceitassem como soberana a Ana Bolena.


Os inocentes homens de Deus, por sua fidelidade à Igreja Católica e sua
doutrina, foram condenados às mais terríveis torturas e morte. 



O então superior da Cartuxa acabou na prisão por ter-se, a princípio, oposto à legalidade do divórcio, mas, depois de um mês, convencido de que este juramento não tocava à sua fé, chegou a jurar a favor do rei e em seguida foi liberado. Voltou para a Cartuxa e convenceu os outros monges de seus argumentos e, assim, em 25 de maio de 1534, juraram aos funcionários, que haviam retornado acompanhados pelos soldados. Um parêntese aqui: o que os monges fizeram não foi dizer que o ato do rei era legítimo, que não seria um pecado pessoal do rei: o de adultério. O que eles entenderam é que o rei, separando-se de Catarina de Aragão, sua esposa, e casando-se, mesmo ilicitamente com Ana Bolena, esta poderia ser tida como rainha da Inglaterra. Como era algo apenas na esfera civil, não contrariava a fé católica.
Bem: a paz não durou muito tempo...  No final de 1534, um novo decreto do rei e do parlamento inglês afirmou que todos os cidadãos ingleses tinham de negar a autoridade do papa e reconhecer o rei como chefe da Igreja Anglicana, também nas coisas espirituais e quem não o fizesse era culpado de crime lesa majestade.




Muitos eram tirados ainda vivos da forca e eviscerados e esquartejados. 


Tendo recebido a notícia, o prior João Houghton reuniu todos os cartuxos e lhes comunicou a ordem do rei. Todos se declaram dispostos a morrer pela Igreja Católica Apostólica Romana. No Cartuxa tinham chegado dois superiores de outras casas (fora da Inglaterra). Foram alertados sobre a situação perigosa dos monges ingleses, mas, em união com os religiosos daquela casa, permaneceram solidários à resolução eles. Os monges da Cartuxa de Londres pediram ao emissário do rei, Tomás Cromwell, que tentasse persuadir Henrique VIII que não os punisse, o que não foi aceito pelo mesmo.
Os dois priores foram presos pelo infame Cromwell e conduzidos à Torre de Londres como rebeldes e traidores. Depois de uma semana passaram por um processo onde, em Westminster, reafirmaram a sua rejeição e, em seguida, foram condenados à morte, novamente presos, e lá, na prisão, juntaram-se a outros dois religiosos condenados pela mesma razão.
Em 04 de maio de 1535 os priores Lourenço Robert e Agostinho Webster, juntamente com o prior Ricardo Reynolds da Ordem de Santa Brígida e o padre João Haile, pároco de Isleworth, vestidos com hábitos religiosos desgastados foram amarrados, deitados em esteiras e arrastados pelas pedras e lama das ruas que levavam a Tyburn, o local notório de execuções.
O padre João Houghton, prior de Londres, também preso e condenado, primeiro subiu à forca e, sem resistência alguma, mas, em suma paz interior, colaborou com o carrasco para ser enforcado, proferindo palavras de perdão e confiança em Deus; mas, ele ainda não havia sufocado quando um dos presentes cortou a corda fazendo com que o padre caísse no chão. O carrasco o despiu, lhe rasgou o ventre e o peito com uma faca e puxou suas entranhas ainda vivo para mostrar seu coração aos conselheiros do rei; seguiu a execução dos outros quatro e seus corpos foram rasgados em pedaços e expostos ao povo para incitar o terror aos "papistas".



Os carrascos os esquartejavam ou retiravam-lhe as
vísceras estando ainda vivos, para causar terror aos "papistas", isto é,
aos católicos fiéis à Santa Sé de Roma.


Três outros cartuxos Umbrido Middlemore, Guilherme Exmew e Sebastião Newdigatede, nobre nascimento, foram presos, torturados e martirizados 19 de junho de 1535. Dois outros que se mudaram de Londres para a Cartuxa de Hull foram denunciados, presos e enforcados em 11 de maio de 1537.
Ainda mais dez cartuxos foram presos em 29 de maio de 1537 em Newgate e vieram a morrer de fome e maus tratos em um curto espaço de tempo, com exceção de um: Guilherme Horn, que sobreviveu à prisão, tendo sido enforcado e esquartejado em 4 de novembro de 1540.
Na Cartuxa, foram dezoito os monges que na esperança de salvar o mosteiro haviam aderido ao juramento, mas, depois de presos, foram expulsos de seu amado mosteiro, posteriormente vendido a particulares.
Os 18 mártires cartuxos de Londres, juntamente com outros 35 mártires daquele período, foram beatificados pelo Papa Leão XIII em 09 de dezembro de 1886.
Alguns mártires daquele período foram canonizados pelo Papa Paulo VI no dia 25 de outubro de 1970, inclusos um grupo de 40 mártires da mesma perseguição inglesa (p.ex.: os citados San Tomás More e João Fisher, São Roberto Campion, etc) A memória litúrgica comum é em 4 de maio, porém, também são lembrados de forma particular em seus respectivos aniversários do martírio.



Fonte de pesquisa: site "Santi e Beati" (www.santiebeati.it)


quinta-feira, 7 de junho de 2018

SÃO FIDÉLIS DE SIGMARINGEN, presbítero e mártir capuchinho - morto por calvinistas



Primeiro Texto Biográfico (Pequena Biografia)


Ele nasceu numa família de nobres em 1577, na cidade de Sigmaringen, na Alemanha, e foi batizado com o nome de Marcos Reyd. Na Universidade de Friburgo, na Suíça, estudou filosofia, direito civil e canônico, onde se formou professor e advogado em 1601. Durante alguns anos, exerceu a profissão de advogado em Colmar, na Alsácia, recebendo o apelido de ‘advogado dos pobres’, porque não se negava a trabalhar gratuitamente aos que não tinham dinheiro para lhe pagar.
Até os trinta e quatro anos, não tinha ainda encontrado seu caminho definitivo, até que, em 1612, abandonou tudo e se tornou sacerdote. Ingressou na Ordem dos Frades Menores dos Capuchinhos de Friburgo, vestindo o hábito e tomando o nome de Fidélis. Escreveu muito, e esses numerosos registros o fizeram um dos mestres da espiritualidade franciscana.
Como era intelectual atuante, acabou assumindo missões importantes em favor da Igreja e, a mando pessoal do papa Gregório XV, foi enviado à Suíça, a fim de combater a heresia calvinista. Acusado de espionagem a serviço do imperador austríaco, os calvinistas tramaram a sua morte, que ocorreu após uma missa em Grusch, na qual pronunciara um fervoroso sermão pela disciplina e obediência dos cristãos à Santa Sé. Em suas anotações, foi encontrado um bilhete escrito dez dias antes de sua morte, dizendo que sabia que seria assassinado, mas que morreria com alegria por amor a Nosso Senhor Jesus Cristo. Quando foi ferido, por um golpe de espada, pelos inimigos, pôs-se de joelhos, perdoou os seus assassinos e, rezando, abençoou a todos antes de morrer, no dia 24 de abril de 1622. O papa Bento XIV canonizou são Fidélis de Sigmaringen em 1724.



Segundo texto biográfico

São Fidélis, capuchinho e mártir, nasceu no ano de 1577, em Sigmaringa, pequena cidade da Alemanha, na Suábia. Seu pai chamava-se João Rey. Fez os primeiros estudos na universidade de Friburgo, na Suíça. Aplicou-se sobremaneira à jurisprudência e formou-se doutor em direito. Levou uma vida mortificada, não bebendo vinho e trazendo sempre o cilício. As virtudes que praticou, entre outras a modéstia e a doçura, valeram-lhe a estima e a veneração de todos os que o conheceram.
Em 1604, partiu com três jovens gentis-homens, que foram enviados a viajar pelas diferentes partes da Europa. Fidélis procurou principalmente inspirar-lhes os mais vivos sentimentos de religião. Sem cessar, dava-lhes exemplo da piedade mais terna. Não deixava passar nenhuma grande festa sem se aproximar da santa comunhão. Em todas as cidades que se encontravam no caminho a ser por ele percorrido, visitava as igrejas e os hospitais e ajudava os pobres, segundo as possibilidades. Chegou até, algumas vezes, a se despojar das próprias roupas, para vestir os indigentes. Após essas viagens, obteve em Colmar, na Alsácia, um lugar na magistratura, cargo que exerceu com muito êxito. A justiça e a religião eram a regra invariável de todo o seu modo de agir.


Interessava-se vivamente pelos indigentes, fato que lhe valeu o cognome de advogado dos pobres. Algumas injustiças que não pode impedir lhe inspiraram desgosto pelo cargo que ocupava. Temendo não ter forças para resistir às ocasiões de pecados, resolveu abandonar o mundo e retirar-se para o convento dos capuchinhos de Friburgo. Vestiu o hábito no ano de 1612 e recebeu do superior o nome de Fidélis. Deu os bens que possuía à biblioteca e ao seminário do bispo, a fim de poder ajudar os jovens clérigos, que não eram suficientemente favorecidos pela fortuna. Todos os outros bens foram distribuídos entre os pobres.
Desde o momento em que se fez religioso, não sentiu ardor senão pelas humilhações e austeridades da penitência. Renunciou à própria vontade, para fazer apenas o que os superiores lhe ordenassem. As tentações que o assaltaram não conseguiram desencorajá-lo. Venceu-as, confiando-se ao diretor espiritual, cujos conselhos seguia com docilidade. As mortificações prescritas pela regra não eram suficientes ao fervor que o dominava.


No advento, na quaresma e nas vigílias das festas, comia apenas pão, frutas secas e tomava água. Nada era capaz de interromper-lhe o recolhimento da alma. Nas orações, pedia sobretudo a graça de não cair nem no pecado nem na tibieza.
Não havia ainda terminado o curso de teologia, e o encarregaram de pregar a palavra de Deus, e de ouvir as confissões dos fiéis. Desempenhou ambos os encargos com grande êxito. Superior do convento de Weltkirch, operou prodígios de conversão nessa cidade e nos lugares vizinhos, descerrando o véu que cobria os olhos aos calvinistas. A notícia dos frutos que acompanhavam seus trabalhos apostólicos chegou até Roma.
A congregação da Propaganda, então, o nomeou para ir pregar aos grisões. Foi o primeiro missionário a ser enviado a esse povo, desde que abraçara o calvinismo.Associaram-lhe oito religiosos de sua ordem, os quais deviam trabalhar sob sua direção. Não se deixou bater nem pelas fadigas nem pelas ameaças que lhe fizeram de lhe tirar a vida. Converteu dois gentis-homens calvinistas, nas primeiras conferências. Em 1622, penetrou no cantão de Prétigout e converteu muitos hereges, fato que se atribui menos à palavra que pregou do que ao fervor e à continuidade das orações.


Tantas conversões fizeram com que os calvinistas entrassem em estranho furor, chegando a tomar armas contra o imperador. Resolveram acabar com elas, desfazendo-se daquele que lhes era o principal causador. O santo missionário, informado das decisões, preparou-se para o que desse e viesse. No dia 24 de Abril de 1622, confessou-se a um dos companheiros, rezou missa e pregou na aldeia de Gruch. O sermão desse dia foi mais ardente do que os anteriores. Predisse sua morte a várias pessoas e, desde então, passou a assinar as cartas da seguinte forma: “Irmão Fidélis, que deve, em breve ser pasto dos vermes”. De Gruch foi pregar em Sevis, onde exortou com veemência os católicos a permanecerem firmemente presos à fé.
Um calvinista procurou alvejá-lo na igreja. Inutilmente os fiéis lhe rogaram que se retirasse. Respondeu que não temia a morte, que estava pronto a sacrificar a vida pela causa de Deus. Enquanto o santo retornava a Gruch, caiu nas mãos de uma tropa de soldados calvinistas, que estavam sendo chefiados por um ministro. Trataram-no de sedutor e quiseram forçá-lo a abraçar o calvinismo. “Que me propondes? Disse Fidélis. Vim ao vosso meio para refutar erros e não para adotá-los. A doutrina católica é a fé de todos os séculos e não vejo por que renunciá-la. De resto, sabei que não temo em absoluto a morte”.

Um do grupo o atirou por terra. Levantando-se, pôs-se, de joelhos e fez a seguinte oração: “Senhor, perdoai meus inimigos. Cegos pela paixão, não sabem o que fazem. Senhor Jesus, tende piedade de mim! Santa Maria, Mãe de Jesus, assisti-me!” Terminada essa oração, recebeu a segunda pancada que o atirou ao chão banhado em sangue. O furor dos soldados não se satisfez com isso. Furaram-lhe o corpo com punhaladas e cortaram-lhe a perna esquerda. A bem-aventurada morte aconteceu-lhe em 1622. Estava com quarenta e quatro anos de idade e dez de profissão.
Os católicos o enterraram no dia seguinte. Algum tempo depois, os imperiais desfizeram os calvinistas, de acordo com uma profecia do santo. O ministro que se colocara à frente dos soldados ficou tão comovido com o fato, que se converteu e abjurou publicamente a heresia.
O corpo do santo missionário se encontra na igreja dos capuchinhos de Weltkirch. A perna esquerda e a cabeça, que tinham sido separadas do tronco, estão na catedral de Coire. A transladação delas se fez com muita solenidade. Grande número de milagres foi operado por intercessão do servidor de Deus.
Foi beatificado por Bento XIII, em 1729, e canonizado por Bento XIV, em 1746. Seu nome foi inscrito no Martirológio Romano, para ser celebrado no dia 24 de Abril.

Fonte: http://www.padrerodrigomaria.com.br/santo-do-dia-24-de-abril-sao-fidelis-de-sigmaringen/


quarta-feira, 6 de junho de 2018

Beato Stanley Francis Rother, Presbítero Missionário e Mártir norte-americano


O Beato que ora apresentamos nasceu nos Estados Unidos da América, mas serviu como missionário na Guatemala. Rezemos pela Guatemala que recentemente sofreu uma erupção vulcânica, o que atingiu muitas pessoas e suas famílias. Que Nossa Senhora ajude nossos irmãos guatemaltecas.




       Stanley Francis Rother nasceu em 27 de março de 1935, em uma pequena cidade chamada Okarche, localizada no estado de Oklahoma, no centro-sul dos Estados Unidos, onde a religião, a educação e as granjas eram os pilares da sociedade. Ele era o mais velho dos quatro filhos de Franz Rother, de origem alemã, e Gertrude Smith. Ele foi batizado dois dias após seu nascimento na igreja da Santíssima Trindade em Okarche, a paróquia que mais tarde ele frequentou com sua família.
Trabalhou quando criança no trabalho agrícola e estudou na escola católica de seu país. Serviu na igreja como ministro e também foi muito envolvido em esportes. Ele recebeu a Primeira Comunhão em 22 de abril de 1942 e foi confirmado em 4 de abril de 1948.
Em sua juventude teve uma vida simples e trabalhava na granja da sua família. Rodeado de sacerdotes, sentiu o chamado de Deus e entrou no seminário. Ali começaria a verdadeira aventura de sua vida. No seminário tinha dificuldades nos estudos, assim como São João Maria Vianney, o Cura D’Ars. A autora da biografia do Pe. Stanley, Maria Scaperlanda, disse que “ambos eram homens simples que sentiram o chamado ao sacerdócio e alguém tinha que autorizá-los para que completassem os seus estudos e se tornassem sacerdotes. Eles trouxeram consigo bondade, simplicidade e um coração generoso em tudo o que faziam”.
Enquanto cursava o ensino médio, Stanley começou a questionar sua própria vocação. Após um tempo de discernimento, ele entrou no Seminário San Giovanni em San Antonio, Texas, em setembro de 1953. Ele continuou seus estudos em setembro de 1956 no Seminário da Assunção, novamente em San Antonio. No entanto, ele era muito mais propenso a questões práticas do que aos estudos, enfrentando assim vários problemas. Para piorar a situação, na época os ensinamentos eram dados exclusivamente em latim, uma língua que ele não conseguia dominar. Então, como suas notas eram muito baixas, ele foi convidado a deixar o seminário.
Após consulta com o monsenhor Victor Reed, bispo da então Diocese de Oklahoma City e Tulsa, Stanley tem uma segunda chance: ele foi internado no St. Mary Seminary Monte em Emmitsburg, Maryland, a partir de setembro de 1959. Ele foi ordenado subdiácono em 2 de junho de 1962 e diácono no dia 15 de setembro seguinte. Finalmente, em 25 de maio de 1963, foi ordenado sacerdote na Catedral de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro em Oklahoma.
Por cinco anos, padre Stanley serviu como vigário paroquial: de 1963 a 1965, na paróquia de San Guglielmo em Durant. Ele foi lembrado como um homem quieto e pacífico, que frequentemente convidava os coroinhas para cortar a grama e se dedicar a vários pequenos trabalhos. Muitas vezes ele ia comer em famílias e participava de acampamentos de verão. De 1965 a 1966 ele foi designado para a paróquia de São Francisco Xavier em Tulsa. Em 1966 foi nomeado vigário paroquial da Catedral da Sagrada Família em Tulsa, mas em setembro de 1966 foi designado para a paróquia de Corpus Christi em Oklahoma.
Quando Stanley ainda estava no seminário, o então Papa João XXIII pediu às dioceses dos Estados Unidos que enviassem assistência e estabelecessem missões na América Central. Foi assim que as dioceses de Oklahoma City e Tulsa estabeleceram uma missão em Santiago Atitlán, uma comunidade indígena muito pobre na Guatemala. Poucos anos depois de ordenado, Pe. Rother aceitou o convite de se unir a esta equipe missionária, onde passaria os 13 anos seguintes de sua vida.
Padre Stanley logo estabeleceu uma conexão com a população de Santiago Atitlán. Como seu primeiro nome próprio era difícil de entender, ele se chamou o segundo: Francisco em espanhol, Apla na adaptação na língua tz'utujil. Apesar de suas dificuldades anteriores com o latim, ele se comprometeu a aprender espanhol e a língua indígena, para se comunicar com seus fiéis e por essa razão, ele escolheu morar com uma família local. Ele aprendeu tão rapidamente que terminou a tradução do Novo Testamento iniciada por seu predecessor e, mais tarde, do Lecionário e do Missal, para que ele pudesse celebrar a Missa em tz'utujil.





A população vivia em cabanas de um só cômodo e mantinha o que podiam cultivar em minúsculos lotes de terra. Padre Stanley, explorando seu passado camponês, ajudou pessoalmente nos campos, introduzindo várias culturas e construindo um sistema de irrigação. Mais tarde, ele também iniciou uma cooperativa agrícola.
Ele constantemente visitava seus fiéis, comia com eles e tratava os doentes, para quem ele abrira um pequeno hospital. Outra realização foi uma rádio que transmitiu programas educacionais e a celebração dominical da missa.
Por sua parte, Pe. Stanley percebeu que tudo o que havia aprendido quando era jovem, na granja da sua família, serviria muito neste novo local, pois como sacerdote missionário, foi chamado não só para celebrar a Missa, mas para ajudar em tarefas simples dos camponeses. “O Padre Stanley tinha uma disposição natural a compartilhar o trabalho com eles, a partilhar o pão e a celebrar a vida com eles, o que fez com que a comunidade na Guatemala dissesse que o Padre Stanley ‘era nosso sacerdote’”, comentou Scaperlanda.





Nos anos de serviço do padre Stanley, a guerra civil assolou a Guatemala. O governo dos presidentes Fernando Romeo Lucas García e Efraín Ríos Montt não fez distinção entre guerrilheiros e assistentes sociais: por isso, milhares de católicos foram mortos por causa de sua missão de promoção humana. Por algum tempo a violência foi restringida às cidades, mas logo chegou também às montanhas. Muitos catequistas desapareceram, enquanto outros fiéis foram encontrados mortos, com sinais de tortura, ao lado das estradas. Até a rádio fundada pelo Padre Stanley foi demitida e seu empresário torturado e morto. Muitas vezes a população, em busca de refúgio, vinha dormir nas igrejas. O chefe dos catequistas Santiago Atitlán, Diego Quic 'Apuchan, apareceu em uma das listas de pessoas a serem eliminadas que circulou no país no final de 1980, sendo sequestrado na noite de 05 de janeiro de 1981, sob os olhos pai Stanley e dos outros trabalhadores paroquianos.
Nos anos de 1980 e 1981, a violência chegou a um ponto quase insuportável e o sacerdote via como seus amigos e paroquianos eram sequestrados ou assassinados. Inclusive o seu nome estava na lista negra. Na carta enviada à sua família em seu último Natal, disse que não queria abandonar a aldeia e estava disposto a entregar a sua vida.
Em suas cartas daquele período, o padre Stanley registrou sua crescente angústia. Na de julho de 1980, destinada a seu amigo Frankie Williams, já voluntário na Guatemala, ele escreveu: “Houve outro padre morto na Quiche enquanto eu estava fora. São três desde o começo de maio. Outro foi sequestrado, ele provavelmente está morto. E o que devemos fazer nesta situação? Não podemos fazer nada além de continuar nosso trabalho, seguir adiante com a cabeça baixa, pregar o evangelho do amor e da não-violência e assim por diante”. Embora preocupado com o impacto real de sua pregação e de outros missionários, ele concluiu na mesma carta: “Deus cuidará dos seus, se estivermos nesse grupo. Nada vai acontecer, exceto o que deve acontecer. Tudo faz parte de seus desígnios”.
Em dezembro de 1980, dois jornais diocesanos relataram a última carta de Natal do padre Stanley. Continha um apelo que também era uma declaração de intenções: “Devemos ter cuidado para onde vamos e o que dizemos a alguém. Um belo elogio me foi feito recentemente quando um suposto chefe da Igreja e da cidade estava reclamando que `O padre está defendendo pessoas´”. Ele quer me deportar pelos meus pecados. Esta é uma das razões pelas quais tenho que ficar apesar do dano físico. O pastor não pode escapar ao primeiro sinal de perigo. Rogai por nós para que sejamos um sinal do amor de Cristo por estas pessoas, para que nossa presença entre elas as fortaleça ao suportar estes sofrimentos, preparando-nos para a vinda do Reino ".
No início de 1981, o nome do padre Stanley apareceu nas listas de proscrição. Por esta razão, ele procurou refúgio de uma casa para outra, mas, para maior segurança, ele foi forçado a retornar aos Estados Unidos por algum tempo. Familiares e amigos gostariam que ele ficasse mais tempo, mas muitas vezes o surpreendiam na janela, com os olhos perdidos no horizonte. Para seu irmão Tom, ele reiterou o conceito que já havia expressado: “Eu só tenho que voltar. O pastor não pode escapar”. Finalmente, com a permissão de seu bispo, o missionário poderia retornar a Santiago Atitlán a tempo da Semana Santa de 1981.
Na noite de 28 de julho de 1981, por volta de uma hora, três homens armados entraram silenciosamente na casa paroquial e dirigiram-se ao quarto do padre Stanley, no andar de cima. Eles encontraram a sala vazia, em seguida, começaram a procurar pelo padre dentro da casa, até que apareceu Bocel Francisco, o jovem irmão de Pedro Bocel, colaborador do missionário. Os invasores pediram que ele os levasse até o padre Stanley ou iriam matá-lo. O menino, aterrorizado, fez o que lhe foi dito. Ele conduziu os três homens armados até o primeiro andar e bateu em uma porta perto das escadas. Padre Stanley saiu da cama e, com toda a probabilidade, examinou brevemente a situação: poderia ter escapado da janela, mas, se o fizesse, Francisco teria morrido. Imediatamente depois, ele abriu a porta. Quando Francisco subiu correndo as escadas, ouviu ruídos de luta e o missionário exclamou: Mate-me aqui. Instantaneamente, foi disparado um tiro primeiro, depois outro.






A morte do padre Stanley, com quarenta e seis anos, deixou os habitantes de Santiago Atitlán chocados. Muitos se reuniram espontaneamente, na praça da igreja, orando em silêncio. A autópsia em seu corpo descobriu que uma bala havia perfurado sua mandíbula, mas o golpe fatal atingiu a têmpora direita. Os hematomas em suas mãos indicavam que ele realmente lutara antes de ser morto.
A notícia de sua morte chegou à sua família alguns dias depois. O funeral aconteceu em Oklahoma e seu corpo foi enterrado no cemitério da Santíssima Trindade em Okarche. Seu coração e um pequeno frasco de seu sangue, no entanto, foram enterrados na igreja de San Giacomo em Santiago Atitlán, enquanto o quarto onde ele foi morto se transformou em uma capela.

A causa da beatificação

A fama do martírio do padre Stanley permaneceu viva e ativa tanto na Guatemala quanto em sua terra natal, Oklahoma. Por essa razão, decidiu-se abrir a causa para sua beatificação, a fim de verificar se sua morte poderia ter realmente acontecido em ódio à fé católica.

A diocese de Sololá-Chimaltenango, em cujo território Santiago Atitlán está localizado, não poderia estar disponível para o início da fase diocesana. A permissão foi então obtida em 3 de setembro de 2007, para que isso acontecesse na diocese de Oklahoma.
Um mês depois, em 3 de outubro, começou a fase diocesana, que terminou em 20 de julho de 2010; Nesse meio tempo, em 25 de novembro de 2009, a autorização da Santa Sé havia chegado. O decreto que validou os documentos do inquérito diocesano tem data de 16 de março de 2012.
A “Positio” sobre o martírio, entregue em 2014 à Congregação para as Causas dos Santos, foi examinado pelos consultores teólogos. Finalmente, em 1 de Dezembro de 2016, o Papa Francisco autorizou a promulgação do decreto com o qual o Padre Stanley Rother seria verdadeiramente declarado um mártir.
Em 10 de maio de 2017 os restos mortais do missionário foram exumados do cemitério da Santíssima Trindade em Okarche, submetido ao reconhecimento canônico e, finalmente, enterrados em uma capela no cemitério da Ressurreição, na região noroeste de Oklahoma.
A beatificação foi celebrada em 23 de setembro de 2017 no Centro de Convenções em Oklahoma. O cardeal Angelo Amato, Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, presidiu a cerimônia como delegado do Santo Padre.
Padre Stanley acaba por ser o primeiro mártir americano oficialmente reconhecido, e o primeiro homem nomeado para os altares de nacionalidade norte-americana.