A vida de São Bernardo comprova essa
profunda transformação: dotado de temperamento violento, extraviou-se no
caminho da turbulência; convertendo-se, com a mesma radicalidade seguiu o
caminho da virtude de modo a alcançar a honra dos altares.
Sim, a história da Igreja trás exemplos de santos e santas que não nasceram "santos"... Na verdade, até, foram grandes pecadores, porém, movidos pela graça, deixaram-se abraçar e abrasar pelo amor de Deus e, generosamente, permitiram que Deus mudasse radicalmente suas vidas.
Sim, a história da Igreja trás exemplos de santos e santas que não nasceram "santos"... Na verdade, até, foram grandes pecadores, porém, movidos pela graça, deixaram-se abraçar e abrasar pelo amor de Deus e, generosamente, permitiram que Deus mudasse radicalmente suas vidas.
São Barnardo nasceu em Corleone (Palermo) no ano 1605. No Batismo deram-lhe
um lindo nome: Filipe. Os biógrafos, ao evocar os seus primeiros anos, dizem-nos
que era um jovem admirado, alto, forte, obstinado, mas dotado de um carácter
decidido, leal e sincero. Igualmente nos asseguram que não era dissoluto, que
frequentava os Sacramentos e era compassivo para com os pobres.
Seu pai era humilde artesão; e a família, tão piedosa que sua
casa era conhecida como a “casa dos santos”. Embora não pudessem dar aos filhos
uma educação esmerada, transmitiram-lhes a riqueza da prática e ensinamentos de
nossa santa Religião
Com o pai aprendeu a profissão de sapateiro, mas, independente
e ambicioso como era, logo começou a trabalhar por conta própria.
Dedicara-se, além disso, à arte da esgrima. Gabava-se diante
de toda a gente de ser o melhor esgrimista da região. Não provocava ninguém, é
certo, mas também não cedia a provocadores. Tinha um caráter fogoso e
independente, dificilmente controlando seu espírito rebelde, insensível a
ameaças e castigos.
Após o falecimento do pai, que tinha certa autoridade sobre
ele, Felipe resolveu fazer-se soldado. Com seu espírito belicoso, logo começou
a meter-se em encrencas, chegando mesmo a tornar-se, algumas vezes, feroz. A um
comissário de guerra que se dirigiu a ele de modo altivo, cortou a cabeça com
um golpe de sabre.
Também decepou o braço de um fidalgo que levantara a mão para
esbofeteá-lo. Matou três bandidos que o assaltaram e ameaçavam tirar-lhe a vida.
Travou vários duelos com companheiros de armas que dele discordavam em qualquer
ponto ou que o desafiavam para saber quem era “melhor” no manejo da espada.
Em meio a esses desvarios, entretanto, Felipe tinha alguns
bons movimentos. Certo dia, por exemplo, em que dois soldados roubaram de um
compatriota seu o dinheiro do trigo que vendera a duras penas, ele os perseguiu
e fê-los devolver o dinheiro.
Outra vez, passando com um amigo por um bosque, ouviu gritos
de socorro. Acorrendo pressuroso, viu uma jovem que se debatia entre quatro
facínoras que queriam roubar-lhe a pureza. Não teve dúvidas: descarregou a
pistola sobre o mais afoito deles e fez os outros fugirem espavoridos.
Quando sentia remorsos por sua má vida, fazia alguma boa obra
para aliviar a consciência. Mas, não ia além. Um dia em que ganhou uma soma
considerável, pensou: “É justo que eu
resgate alguns dos meus pecados”. E depositou a quantia no cofre de esmolas
de um hospital.
Seu rancor era proverbial e não perdoava nem mesmo os mortos.
Assim, certa vez, quando se realizavam os funerais de um senhor com quem havia
tido um atrito, entrou na igreja no momento da encomendação do corpo e, diante
da viúva e dos parentes do falecido em lágrimas, começou a gargalhar, para dar
mostras de sua alegria por aquela morte.
Isso lhe valeu uma boa sova. Mais ainda: os parentes do
falecido entraram em processo criminal contra o brigão, que foi perseguido pela
polícia, tendo que se refugiar numa igreja para gozar do “direito de asilo”.
Hora da Providência: a
conversão de São Bernardo de Corleone.
Chegara, finalmente, o momento para mudança de vida.
Abandonado, perseguido pela justiça e pela própria consciência, Felipe foi aos
poucos caindo em si. Não tendo outra coisa a fazer, começou a considerar a
miserável vida que levava, e quão perto estava de sua eterna perdição.
A graça, penetrando em sua alma, fez o resto. Com um coração
contrito e humilhado, pediu a Deus perdão por seus pecados e prometeu
retirar-se do mundo para terminar seus dias em atos de penitência e de piedade.
Depois de uma contrita confissão geral, dirigiu-se ao convento capuchinho de
Palermo.
O superior, conhecendo sua reputação, tratou-o com rigor e
mandou-o falar com o Padre Provincial, então de visita ao convento da cidade.
Este também conhecia a má fama de Felipe e não o quis receber. Finalmente,
tocado pelas insistências do infeliz, deu-lhe esperanças de o admitir na Ordem
se ele fizesse, à família enlutada, reparação cabal pelo escândalo dado.
Felipe, apesar do obscuro nascimento, era dessas almas que se
entregam com ardor ao bem, após ter-se entregue ao mal. Tinha horror à
mediocridade e não gostava de meios termos. Assim, por mais dolorosa que fosse
a prova, enfrentou-a com de forma altaneira e foi lançar-se aos pés das pessoas
afetadas, pedindo-lhes humildemente o perdão.
Aqueles bons cristãos, vendo seu sincero arrependimento, o
concederam de coração. Assim Felipe foi recebido no noviciado, mudando seu nome
para Bernardo de Corleone, que o
imortalizaria. Tinha então 27 anos de idade.
Radicalidade santa na
prática da virtude
Uma vez postas as mãos no arado, Frei Bernardo não olhou mais
para trás, e caminhou a passos largos pela senda da humilhação e da penitência
com o mesmo ardor com que se tinha entregue ao mal. De espírito independente
antes, mostrou-se agora o mais obediente dos religiosos, procurando mesmo
adivinhar o menor desejo dos superiores.
Como antes tinha sido ganancioso e desejoso dos bens terrenos,
observou de tal maneira a santa pobreza, que muitos o comparavam ao Poverello
de Assis. Nada possuía, a não ser um hábito gasto, um terço, uma cruz e uma
disciplina (espécie de “chicote”) para domar os impulsos desregrados de seu
temperamento. Passou a dormir no chão, e apenas três horas por noite.
Disciplinava-se (chicoteava-se) até o sangue e vivia a pão e
água. As rudes provas a que o submetiam seus superiores, por mais humilhantes
que fossem, apenas aumentavam-lhe o fervor. Sofreu inúmeros assaltos do
demônio, os quais, em vez de abalar sua constância, o fortaleciam cada vez mais.
São Bernardo de Corleone sendo atacado visivelmente por vários demônios. |
São Bernardo gozava de aparições de Nosso Senhor e de Nossa Senhora |
Em Palermo todos comentavam tão profunda mudança. Um alto
funcionário do rei foi um dia ao convento para comprovar o que diziam do antigo
malfeitor.
Quando o viu junto a si, tratou-o com altivez e desdém. Mas as
respostas de Frei Bernardo foram tão sobrenaturais, tão humildes e desapegadas,
que o fidalgo acabou abraçando-o efusivamente, pedindo-lhe desculpas por sua
altivez e recomendando-se às suas orações.
No dia da profissão religiosa de Frei Bernardo, o povo de
Corleone acorreu em multidão para edificar-se com esse exemplo tão cabal de
conversão religiosa.
São Bernardo Corleone: de grande pecador, pela oração e penitência, dócil à graça de Deus, tornou-se um grande santo. |
Caridade exímia para
com os necessitados
Foi com verdadeira alegria que recebeu a função de enfermeiro
numa época em que havia no convento vários frades com moléstia contagiosa.
Frei Bernardo prestava-lhes os auxílios mais humilhantes,
tratando a cada um como se fosse o próprio Cristo Jesus. Foi também ajudante de
cozinha e, para exercer melhor a humildade, lavava as roupas dos sacerdotes do
convento.
Entretanto, queria mais. Por isso, implorou aos superiores
licença para socorrer os habitantes de Scarlato, muitos dos quais morriam por
causa de uma epidemia que assolara a cidade. Assim, os habitantes da região
passaram a ver nele um anjo tutelar, a quem recorriam em todas as vicissitudes.
E vários fatos provaram a caridade e bom senso desse irmão leigo.
Bernardo era muito solidário com seus companheiros frades e
com toda a comunidade. Assim, quando ocorria uma catástrofe na cidade, como um
terremoto ou furacão, típicos da região, Bernardo ajoelhava-se orando em
penitência diante do Sacrário dizendo essas palavras: "Senhor, desejo essa graça!". O resultado sempre era
favorável, pois as calamidades cessavam, poupando uma desgraça maior.
Um dos êxtases de São Bernardo de Corleone |
A sua simplicidade se assemelhava aos primeiros e genuínos
capuchinhos, nostálgico das origens e fascinado pela experiência da vida de
ermitão. Um grande júbilo acompanhava esta sua devoção mariana, cheia de calor,
fantasia e festividade, de fato contagiante. O seu amor a Nossa Senhora era
incontestável e sublime.
Bernardo, comovia não só por sua extraordinária penitência.
Mas porque tinha grande delicadeza e doçura na atenção para com os outros, uma
alegria e plenitude de vida que impressionava. Aos frades forasteiros fazia
festa, para os pobres estava sempre disponível e para os doentes tinha um
coração materno. Assistir-lhes e servir-lhes era a sua felicidade.
Preso e feito escravo
por corsários muçulmanos
Deus queria que Bernardo, por novos sofrimentos, expiasse mais
cabalmente as faltas da vida passada. Certo dia, os religiosos o mandaram fazer
uma viagem por mar, de Palermo a Messina. O barco em que viajava foi atacado
por corsários muçulmanos, e ele levado prisioneiro para o Magreb, onde foi
vendido como escravo.
Já essa situação de escravidão entre infiéis é, de si, penosa.
Mas a dele foi agravada pelas importunações impuras de uma jovem escrava.
Evidentemente ele se opôs com toda tenacidade àquele pecado. O que levou a
mulher, irritada, a obter do patrão comum que, depois de o ter espancado
severamente, pusesse Frei Bernardo a ferros em imundo cubículo.
Finalmente, Deus quis recompensar seu servidor, e numa troca
de prisioneiros ele voltou para a Itália.
Frei Bernardo de Corleone fazia-se notar por sua terna devoção
à Paixão de Cristo, um profundo amor à Virgem Maria e à Santíssima Eucaristia —
e, coisa rara para a época, tinha a dita de comungar diariamente. Quando se
encontrava diante do Sacrário, concentrado em oração, o tempo, para ele,
deixava de existir e não raro as pessoas se comoviam com a pureza de sua
atitude. Além disso, ajudava o sacristão em suas tarefas diárias, para ficar
ainda mais perto de Jesus Eucarístico.
Praticando o primeiro Mandamento em grau heróico, amava a Deus
sobre todas as coisas; e também ao próximo como a si mesmo. Por isso, assolando
a peste a cidade de Castelnuovo, obteve dos superiores licença para acompanhar
cinco religiosos capuchinhos que lá iam socorrer os atingidos. Entregando-se de
corpo e alma ao cuidado deles, sua natureza, antes tão robusta, mas gasta por
penitências e privações voluntárias, sucumbiu. Atingido pela peste, Frei
Bernardo faleceu no dia 12 de janeiro de 1667, na idade de 60 anos.
Seu funeral foi um acontecimento no reino da Sicília. Tal era
a fama de sua santidade, que os grandes do reino quiseram ter a honra de
carregar sobre os ombros seu caixão.
Muitos milagres ocorreram junto a seu túmulo, o que levou o
arcebispo de Palermo a trabalhar pelo seu processo de canonização. Seu corpo
foi exumado sete meses depois de sua morte e encontrado incorrupto. O Papa
Clemente XIII beatificou-o em maio de 1768 e São João Paulo II canonizou-o em 2001.
Oração
Senhor, que em São Bernardo de Corleone nos
destes um modelo extraordinário de penitência evangélica, concedei-nos, por
sua intercessão, a graça de relativizar tudo o que é temporal e transitório,
para sermos dignos da recompensa eterna. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso
Filho, na unidade do Espírito Santo.
São Bernardo de Corleone, rogai por nós! |
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