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terça-feira, 4 de março de 2014

Beato Inocêncio de Berzo, Presbítero Capuchinho (1844-1890)


Beato Inocêncio de Berzo, Presbítero Capuchinho
O beato Inocêncio nasceu em Niardo, Vale Camônica (Bréscia), de família modesta e religiosa, e morreu em Bérgamo. Foi primeiro sacerdote na diocese de Bréscia, na qual desenvolveu um fecundo apostolado, até que, em 1874, ingressou na Ordem Capuchinha. Distinguiu-se sempre por sua austeridade, simplicidade, caridade para com os pobres, penitência e vida contemplativa. A Eucaristia e a Virgem foram devoções suas acentuadas. O beatificou João XXIII em 1961.

O domingo, dia 12 de novembro de 1961, a “glória de Benini” na Basílica Vaticana vestia suas melhores galas e fulgores para honrar a um novo beato, esta vez na figura de um humilde frade da Ordem Capuchinha. Referimo-nos ao beato Inocêncio de Berzo (seu nome civil era Giovanni Scalvinoni), cuja causa de beatificação, introduzida em 22 de janeiro de 1919 na Sagrada Congregação dos Ritos, cerrava, então, seu primeiro ciclo solene.

Brota esta humilde flor – como um “edelweis” entre branca neve – em um dos mais pitorescos vales alpinos, ao norte da Itália, em Val Camônica, província de Bréscia, em 19 de março de 1844. Eram seus pais Pietro Scalvinoni e Francesca Poli, tão escassos de recursos como ricos de espírito cristão, sempre abandonados nas mãos do Senhor e confiados em sua divina providência. Oração, trabalho e amor mútuo era o programa de vida e ninguém ira dormir na família sem haver participado na reza coletiva do santo Rosário. Em tal ambiente deu início a sua formação interior que o levaria logo à santidade.

Quando contava apenas três meses se encontra já sem pai, vítima de enfermidade. De sua mãe aprende logo o santo temor de Deus, uma devoção filial à Santíssima Virgem e um delicado amor à pureza. Aos nove anos, o bispo diocesano (de Bréscia) lhe dava a primeira comunhão, que recebeu com indescritível contentamento e candura. Seus olhinhos vivos se cravavam no tabernáculo e na sagrada espécie com a fé consciente do adulto, como se visse a presença real do Senhor. Mas aquele primeiro abraço eucarístico parecia assinalar uma transformação fundamental. O que lhe havia dito Jesus? Pronto se desvelaria o segredo quando um dia disse todo feliz a sua mãe que o Senhor lhe chama. Notícia que ela acolhe com emoção e lágrimas, dando profundas graças a Deus pela predileção tão singular: a vocação ao sacerdócio.


Caminho do Altar

Recebido o sacramento da Confirmação em 03 de outubro de 1861 do mesmo Dom Verzeri, que lhe havia dado a comunhão, ingressa no Colégio Marinoni, de Lovere. Cinco anos esteve nele, superando com brilhantismo os estudos do ginásio, até que passou seguidamente ao seminário diocesano de Bréscia, onde completaria seus estudos. Ali foi um maravilhoso exemplo para seus companheiros. Para melhor corresponder à graça de sua vocação se pôs desde os primeiros dias debaixo da proteção da celestial Senhora, como fizera também em seus anos o santo Cura d’Ars.
Em 23 de dezembro de 1865 dava seu  primeiro passo solene do subdiaconato, caminho do altar, ao qual chegaria com a ordenação em 02 de junho de 1867, aos 23 anos de idade, das mãos do mesmo prelado que lhe deu a Comunhão e a Confirmação. Que viva emoção para o mesmo e para sua mãe, e para os bem feitores ali presentes que lhe haviam auxiliado em suas despesas até o altar!

Seu primeiro destino é a paróquia de Cevo, uma dessas rurais, implantadas entre riscos montanhosos na alta Val Camônica, como coadjutor de um venerável e boníssimo pároco, dom Codenatti. Este, ao dar conta à cúria diocesana, escreve: “O Senhor me abençoou ao mandar-me este piedoso e zeloso coadjutor”.

O centro de seu ministério apostólico será o confessionário. Sabia insinuar-se suavemente nas almas com aquela bondade e afabilidade que são as melhores medicinas para curar as almas e conduzi-las a Deus. Muitos acorriam a ele como a um santo; não poucos pecadores, inclusive obstinados, regressavam convertidos. Imitava, assim, ao Bom Pastor, que com gozo e ternura acolhia às ovelhas desgarradas e não as perdia de vista até reconduzi-las ao redil.
Sua pessoa era uma benção para toda a comarca. Os párocos o disputavam para a pregação, porque sua palavra vibrante de doutrina, de unção e de graça procedia de um coração ardente de fé e de amor que agradava a todos e a todos edificava.

“Onde está o colchão, filho meu”?

Sua caridade não tinha limites. Por ele, daria tudo. Tirava da panela as melhores porções da comida para leva-los aos pobres mais famintos e necessitados. Um dia, sua mãe reprovou este proceder. Contestando-lhe, ele, de joelhos e respeitosamente, lhe disse: “perdoa-me, os reparti entre uns pobres enfermos”. Ao que replicou ironicamente sua mãe: “bendito filho, até o pote eu devo fechar a ‘sete chaves’”?

Um dia, sua mãe, ao limpar sua habitação, repara que não tem colchão na cama. “Onde tens dormido esta noite, filho meu”? Pergunta-lhe.  Ele finge não compreendê-la. “Onde posso ter dormido senão em minha habitação”?

“Quero dizer, sobre que coisa tens descansado, já que não está aqui o último colchão que com tantos sacrifícios procurei conseguir para ti semana passada”?

“Ah, sim! Havia me esquecido de dizê-lo.  Ontem, durante sua ausência... Se houvésseis visto aquela casa e aquela enferma de sete anos já! Creia-me, a mim me vai melhor dormir assim”.
E na habitação, em lugar do colchão, a mãe havia achado uns feixes de lenha...

Outro dia, apresentando-se um pobre, necessitado de tudo. O santo vai olhar a dispensa e os armários. Tudo fechado. Porém, ah!, no fogão há um frango que está cozinhando. Ó providência! Sem titubear, pega o frango e o dá ao pobre. Regressa a mãe à casa e, mecanicamente, coloca nova lenha ao fogo do forno; mas, quando logo se dispõe a destampar a panela para retirar o frango, este havia “voado”!
Dadas suas atitudes para tratar com a juventude, o prelado, às instâncias do reitor Bertazzoli, o nomeia vice-reitor do seminário diocesano, o que serviu para a edificação de todos. Em uma manhã invernal, ao regressar ao seminário, viu um pobre ancião, descalço e mal vestido, que tremia de frio. Tanta compaixão o inspirou que retirando o calçado presenteou-o ao pobre velho. Alunos e professores creram que naquele dia ele havia esquecido de por os sapatos...



Buscando as pisadas seráficas...

De Bréscia passa a Berzo inferior, de coadjutor de dom Geresetti, com iguais mostras de santidade que em Cevo entre seus paroquianos. A poucos quilômetros dali, em frente, sobre um monte quebrado, se ergue o antigo convento da Anunciação, dos padres capuchinhos da Lombardia. Gostava de visitar este solitário convento, fundado em 1475 pelo beato Amadeo de Silva, nobre português, e que, com o tempo, foi lugar de retiro de varões ilustres em ciência e virtude.
Ali ouviu a voz do Senhor que o convidava a seguir as pegasdas do “serafim de Assis” (São Francisco). Recebidas as letras testemunhais da cúria diocesana e a conseguinte aceitação do provincial dos frades, em 16 de abril de 1874 vestia o hábito capuchinho tomando o nome de Frei Inocêncio. Tentou-lhe o demônio com escrúpulos e remorsos vãos, até que ao fim, com o auxílio de Deus e da Virgem, recobrou a paz em sua alma atormentada.
Em 29 de abril de 1875 emitia sua profissão religiosa. Aos dois meses partia para o “professório” de Albino. Em outubro de 1876 regressava a Berzo como vice-mestre de noviços da Anunciação, onde, por espaço de dez anos foi uma estampa vivente de profunda humildade, contínua oração e austeríssima penitência.

Sua austeridade havia sido rigorosíssima, tanto que evocava à de São Pedro de Alcântara. No inverno, metia os pés e as mãos em água gelada. No verão se expunha aos ardentes raios do sol e suportava aos molestos insetos tais como moscas, mosquitos e besouros. Disciplinava seu corpo com chibatadas e cilícios. A pele dos ombros, escápulas e dorso estavam muitas vezes salpicadas de sangue. Parecia um esqueleto, de modo que aos quarenta anos de idade, encurvado e decrépito, as pernas trêmulas e vacilantes, inspirava verdadeira lástima. Não dava satisfação alguma a seu corpo; temia sempre que o corpo predominasse sobre o espírito.

Em 1886 o destinaram ao convento de Milão para colaborar na redação dos “Anais Franciscanos”. Daqui passa ao convento de Crema; e, de novo, ao convento da Anunciação, de Berzo, como preceptor dos jovens estudantes. Então, sua saúde terrivelmente minada por suas tremendas penitências e achaques preocupa aos superiores que pensam transladar-lo a um melhor trato em Bérgamo; porém, já demasiado tarde. Seus últimos instantes são assistidos pelo monsenhor Celestino Cattaneo, prelado também capuchinho, amigo e admirador seu. Recebe os santos sacramentos e saúda à “irmã morte” louvando o Senhor, em 03 de março de 1890. Seu enterro foi um plebiscito popular de veneração ao santo, até o ponto que, apesar da vigilância, as pessoas foram cortando-lhe o cabelo, barba e hábito, que teve que ser mudado por três vezes.
Como dado curioso, diremos que os dois milagres apresentados a sua causa de beatificação se realizaram em dois meninos: um de sete anos, afetado de oclusão intestinal com perfuração e peritonite séptica mortal, e o outro, de quatro anos, com tumor maligno cerebral, que, praticada a biópsia, dava prognóstico letal.


[Luis Sanz Burata, El nuevo Beato Inocencio de Berzo, en Eccesia 21 (11-XI-1961) pp. 1437-38]

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