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quarta-feira, 12 de março de 2014

SANTA FRANCISCA ROMANA, Viúva, Religiosa e Fundadora: Modelo de Santidade para todas as Mulheres



Mulher forte, como a da Sagrada Escritura, “a mais romana de todas as Santas” iluminou as almas e socorreu os necessitados num dos mais conturbados períodos da História da Igreja.

O Divino Salvador instituiu Sua Igreja sobre alicerces bem seguros: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mat. 16, 18). Mas, ao longo da História, as forças infernais não deixaram de investir contra essa rocha inabalável.

Uma dessas investidas teve início com as agitações políticas e sociais que forçaram o Papa Clemente V a transferir, em 1309, a sede do Papado para a cidade francesa de Avignon, os sucessores de Pedro permaneceram até 1376. Foi um longo período de conturbações que culminaram no Grande Cisma do Ocidente (1378-1417).

A eclosão do Cisma veio agravar ainda mais a situação, a ponto de a Cidade Eterna ficar reduzida a uma situação de miséria, açoitada por guerras, carestia e pestes. Nesse contexto, destacou-se como luminoso anjo da caridade uma jovem dama da alta nobreza: Santa Francisca Romana, a qual, por sua prodigiosa atividade em favor dos pobres e doentes, conquistou o honroso título de Advocata Urbis (Advogada da Cidade).


Piedade precoce

Nascida em 1384, Francisca pertencia a uma rica família de patrícios romanos. Seus pais, Paulo Bussa de Leoni e Jacovella de Broffedeschi, proporcionaram-lhe uma primorosa educação cristã. Desde a mais tenra idade, acompanhava a mãe nas práticas de piedade, como abstinências, orações, leituras espirituais e visitas a igrejas onde pudessem lucrar indulgências.

Frequentava muito a Basílica de Santa Maria Nova, a preferida de sua mãe, confiada aos monges beneditinos de Monte Olivetto. Ali, Francisca começou a receber, ainda criança, direção espiritual de Frei Antônio di Monte Savello, com quem se confessava todas as quartas-feiras.

Aos onze anos, manifestou o desejo de consagrar-se a Deus pelo voto de virgindade. Sua inclinação para a vida monástica se fez notar quando — a conselho do diretor espiritual, para provar a autenticidade de sua vocação — começou a praticar em casa algumas austeridades próprias a certas ordens religiosas femininas. Seu pai, porém, opôs-se a esses infantis projetos, pois ela estava já prometida em casamento a Lourenço Ponziani, jovem de nobre família, bom caráter e grande fortuna.

Esposa exemplar

Francisca foi sempre esposa exemplar. Por desejo do marido, apresentava-se em público com a categoria de dama romana, usando belas joias e suntuosos trajes. Mas debaixo deles vestia uma tosca túnica de tecido ordinário. Dedicava à oração suas horas livres, e nunca negligenciava as práticas de vida interior. Transformou em oratório um salão do palácio e aí passava longas horas de vigília noturna, acompanhada por Vanozza. Era objeto de mofa das pessoas mundanas, mas sua família a considerava um “anjo da paz”.


Os desígnios da Providência

Três anos após seu casamento, contraiu uma grave enfermidade que se prolongou por doze meses, deixando temerosos todos os membros da família. Francisca, porém, não temia, pois colocara sua vida nas mãos de Deus, com inteira resignação. Nesse período de prova, por duas vezes apareceu-lhe Santo Aleixo. Na primeira, perguntou-lhe se queria curar-se, e na segunda comunicou-lhe que “Deus queria que permanecesse neste mundo para glorificar seu nome”. Colocando então seu manto dourado sobre ela, restituiu-lhe a saúde.

Essa enfermidade, contudo, a fizera meditar profundamente sobre os planos da Providência a seu respeito. E uma vez restabelecida, decidiu, com Vanozza, levar uma vida mais conforme ao Evangelho, renunciando às diversões inúteis e dedicando mais tempo à oração e às obras de caridade.

Proteção do Anjo, ataques do demônio.

Foi nessa época que Deus enviou-lhe um Anjo especial para guiá-la na via da purificação. Ela não o via, mas ele estava constantemente a seu lado e se manifestava por meio de sinais claros. Além de amigo e conselheiro, era vigilante admoestador, que a castigava quando ela cometia qualquer pequena falta. Certa vez em que Francisca, por respeito humano, não interrompeu uma conversa superficial e frívola, ele aplicou-lhe na face um golpe tão forte que deixou sua marca por vários dias e foi ouvido na sala inteira!

O demônio empreendia todo tipo de esforços para perturbar a vida e, sobretudo, impedir a santificação de Francisca. Como a Santa sempre triunfava de suas tentações, ele recorria com frequência a ataques diretos. Assim, em certa ocasião ela e Vanozza retornavam da Basílica de São Pedro e decidiram tomar um atalho, pois já era tarde. Chegando à margem do Tibre, inclinaram-se para tomar um pouco de água. Empurrada por uma força invisível, Francisca caiu no rio. Vanozza lançou-se para salvá-la e foi também arrastada pela correnteza. Sentindo em perigo suas vidas, recorreram a Deus e no mesmo instante se viram de novo na margem, sãs e salvas.


Modelo de mãe e de dona de casa

Quando em 1400 nasceu seu primeiro filho, João Batista, não duvidou em deixar algumas de suas mortificações e exercícios piedosos, para melhor cuidar do menino. Ao carinho materno, unia a firmeza da boa educadora, corrigindo-o em suas infantis manifestações de teimosia, obstinação e cólera, sem nunca ceder às suas lágrimas de impaciência. Foi modelo de mãe igualmente para João Evangelista e Inês, que nasceram alguns anos depois.

Seu Anjo ajudou-a a levar sua vida matrimonial com amor e dedicação, tanto para o esposo quanto para os filhos. Cumpria com perfeição seu ofício de dona de casa, compreendendo que os sacrifícios impostos pelas tarefas cotidianas fazem parte da purificação necessária nesta vida e têm prioridade sobre as mortificações particulares. Desempenhou-se de tal maneira que, em 1401, quando faleceu a esposa do velho Ponziani, seu sogro, este a incumbiu do governo do palácio. Nessa função, a jovem senhora demonstrou grande capacidade, inteligência e, sobretudo, bondade.



Organizou os trabalhos da numerosa criadagem de modo a todos terem tempo de cumprir seus deveres religiosos. Assistia-os em suas necessidades materiais e os incentivava a levar uma vida verdadeiramente cristã. Quando algum deles adoecia, Francisca se fazia de enfermeira, mãe e irmã. E se a enfermidade acarretava perigo de vida, ela mesma ia buscar a assistência espiritual de um sacerdote, a qualquer hora do dia ou da noite.



Prodígios realizados em vida

Por volta de 1413, a fome se abateu sobre Roma. O sogro de Francisca alarmou-se ao ver que ela continuava muito generosa para ajudar os necessitados, distribuindo-lhes parte das provisões que ele reservara para sustento da família, e proibiu-a de fazê-lo. Não podendo mais a caridosa dama dispor daqueles víveres para socorrer os famintos, começou a pedir esmolas para eles. E certo dia, tomada de súbita inspiração, foi com Vanozza a um celeiro vazio do palácio para procurar o que pudesse ter restado de trigo no meio da palha. À custa de paciente trabalho, conseguiram recolher alguns poucos quilos do desejado grão. Coisa admirável: logo após a saída das duas, Lourenço, seu esposo, entrou no celeiro e lá encontrou 40 sacos contendo, cada um, 100 quilos de trigo dourado e maduro...

Idêntico prodígio se deu na mesma época: querendo levar aos pobres um pouco de vinho, Francisca recolheu a escassa quantidade que restava no fundo de um tonel e no mesmo instante este se encheu milagrosamente de um excelente vinho.

Esses prodigiosos fatos muito contribuíram para suscitar em Lourenço um temor reverencial e amoroso por sua esposa. Em consequência, ele lhe deu liberdade de dispor de seu tempo para suas obras apostólicas e lhe permitiu trocar seus belos trajes e joias — os quais ela apressou-se a vender para distribuir aos pobres o dinheiro — por roupas simples e pouco vistosas.


Guerras e provações

Muitas provações ainda a aguardavam. A situação política da Península Itálica e a crise decorrente do Grande Cisma do Ocidente acarretaram-lhe muitos sofrimentos. Roma estava dividida em dois grupos que travavam encarniçada guerra: a favor do Papa, os Orsini, de cuja facção Lourenço fazia parte; de outro lado, os Colonna, apoiando Ladislau Durazzo, rei de Nápoles, que invadiu Roma três vezes. Na primeira invasão, Lourenço foi gravemente ferido em combate, sendo curado pela fé e dedicação da esposa. Na segunda, em 1410, as tropas saquearam o palácio dos Ponziani, e os bens da família foram confiscados. Pior ainda, Francisca viu seu esposo e seu filho Batista partirem para o exílio.

Em 1413 e 1414, a capital da Cristandade ficou entregue à pilhagem e reduzida à miséria. Um novo flagelo, a peste, veio agravar essa situação. A Santa transformou o palácio em hospital e cuidava pessoalmente das vítimas da terrível doença. Era um anjo da caridade naquela infeliz cidade assolada pelo infortúnio.

Sua própria família não ficou imune a essa tragédia: em 1413 morreu Evangelista, seu filho mais novo, e no ano seguinte a pequena Inês. Por fim, ela também contraiu a doença, mas foi milagrosamente curada por Deus.

Visões e dons sobrenaturais

Ainda em 1413, apareceu-lhe seu filho falecido havia pouco, tendo a seu lado um jovem do mesmo tamanho, parecendo ser da mesma idade, mas muito mais belo.

- És realmente tu, filho do meu coração? — perguntou ela.

Ele respondeu que estava no Céu, junto com aquele esplendoroso Arcanjo que o Senhor lhe enviava para auxiliá-la em sua peregrinação terrestre.

- Dia e noite o verás ao teu lado e ele te assistirá em tudo — acrescentou.

Aquele Espírito celestial irradiava tal luz que Francisca podia ler ou trabalhar à noite, sem dificuldade alguma, como se fosse dia. E lhe iluminava o caminho quando precisava sair à noite. Na luz desse Arcanjo, ela podia ver os pensamentos mais íntimos dos corações. Recebeu, ademais, o dom do discernimento dos espíritos e o de conselho, os quais usava para converter os pecadores e reconduzir os desviados ao bom caminho.

Deus a favoreceu com numerosas outras visões. As mais impressionantes foram as do inferno. Viu em pormenores os suplícios pelos quais são punidos os condenados, de acordo com os pecados cometidos. Observou a organização hierárquica dos demônios e as funções de cada um na obra de perdição das almas, uma paródia da hierarquia dos Coros Angélicos. Lúcifer é o rei do orgulho e o chefe de todos. Viu ainda como os atos de virtude praticados pelos bons atormentam essas miseráveis criaturas e prejudicam sua ação na terra.

Vida de apostolado

Tendo falecido o rei Ladislau, restabeleceu-se a paz na Cidade Eterna, seu esposo e seu filho Batista regressaram do exílio, e a família Ponziani recuperou os bens injustamente confiscados.

Por meio de orações e boas palavras, a Santa conseguiu convencer Lourenço a reconciliar-se com seus inimigos e a entregar-se a uma vida de perfeição. E após o casamento do filho, entregou à nora — convertida por ela — o governo do palácio para dedicar-se inteiramente às obras de caridade e de apostolado.

Lourenço deixou-a livre para fundar uma associação de religiosas seculares, com a condição de continuar vivendo no lar e não parar de guiá-lo no caminho da santidade. Orientada por seu diretor espiritual, fundou uma sociedade denominada Oblatas da Santíssima Virgem, segundo o modelo dos beneditinos de Monte Olivetto. Em 15 de agosto de 1425, Francisca e outras nove damas fizeram sua oblação a Deus e a Maria Santíssima, mas sem emitir votos solenes. Vivia cada qual em sua casa, seguindo os conselhos evangélicos, e se reuniam na igreja de Santa Maria Nova para ouvir as palavras de sua fundadora, que para elas era guia e modelo a imitar.

Alguns anos depois, ela recebeu a inspiração de transformar essa sociedade em congregação religiosa. Adquiriu o imóvel de nome Tor de’ Specchi e, em março de 1433, dez Oblatas de Maria foram revestidas do hábito e ali se estabeleceram, em regime de vida comunitária. Em julho desse mesmo ano, o Papa Eugenio IV erigiu a Congregação das Oblatas da Santíssima Virgem, nome mudado posteriormente para Congregação das Oblatas de Santa Francisca Romana. Era uma instituição nova e original para seu tempo: religiosas sem votos, sem clausura, mas de vida austera e dedicadas a um genuíno apostolado social.

Comprometida como estava pelo matrimônio, somente depois da morte do esposo, em 1436, Francisca pôde afinal realizar o maior desejo de sua vida: fazer-se religiosa. Entrou como mera postulante na congregação por ela fundada. Mas foi obrigada — pelo capítulo da comunidade e pelo diretor espiritual — a aceitar os encargos de superiora e fundadora.


Viu o Céu aberto e os Anjos vindos para buscá-la

Viveu no convento apenas três anos. Em 1440, viu-se forçada a retornar ao palácio Ponziani para cuidar de seu filho, gravemente enfermo. Atingida por uma forte pleurisia, ali permaneceu, por não ter mais forças. Soube então que havia chegado seu derradeiro momento. Padeceu terrivelmente durante uma semana, mas pôde dar seus últimos conselhos às suas filhas espirituais e despedir-se delas.

No dia 9 de março, depois de agradecer a seu diretor, o Padre Giovanni, em seu nome e no da comunidade, quis rezar as Vésperas do Ofício da Santíssima Virgem. Com os olhos muito brilhantes, dizia estar vendo o Céu aberto e haverem chegado os Anjos para buscá-la. Com um sorriso iluminando-lhe a face, sua alma deixou esta Terra.

Ao elevá-la às honras dos altares, em maio de 1608, o Papa Paulo V qualificou-a de “a mais romana de todas as Santas”. E o Cardeal São Roberto Belarmino, que contribuíra decisivamente, com seu voto, para a canonização, declarou no Consistório: “A proclamação da santidade de Francisca será de admirável proveito para classes muito diferentes de pessoas: as virgens, as mulheres casadas, as viúvas e as religiosas”.


Quatro séculos depois, o Cardeal Ângelo Sodano traçava dela este quadro: “Lendo sua vida, parece que nos deparamos com uma daquelas mulheres fortes, das quais estão repletos os Livros Sagrados e as páginas da História da Igreja. […] Mulher de ação, Francisca hauria, contudo, de uma intensa vida de oração a força necessária para seu apostolado social”.

Precioso conselho para todos nós: é “de uma intensa vida de oração” que nos vem a força para levar avante nossas obras de apostolado.

(Revista Arautos do Evangelho, Março/2009, n. 87, p. 30 a 33).

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