O mote feminista
“mulheres comportadas raramente fazem
história” pode ser bem discutível quando olhamos para essa lista. A frase
só é aplicável se entendemos que “comportada” é uma mulher insossa e que não se
interessa por nada nem ninguém. Mas se os que repetem essa frase chamam de
“comportadas” as mulheres com uma estatura moral irrepreensível, então estão
enganados.
Embora a Igreja
Católica confira o sacramento da ordem – que torna alguém diácono, padre ou
bispo – apenas a homens, isso não significa que as mulheres sejam meras atrizes
coadjuvantes em sua história. A começar por Maria, a mãe de Jesus, cuja
veneração acima de todos os outros santos é incompatível com a imagem de
opressora das mulheres que às vezes se tenta colocar à Igreja Católica; e por
Maria Madalena, a primeira a ver Jesus ressuscitado, a “apóstola dos
apóstolos”, como é chamada pela tradição oriental.
Ultimamente, as
mulheres têm passado a ocupar papéis na Igreja também institucionalmente. Bento
XVI nomeou em 2010 duas subsecretárias para organismos da Cúria Romana: na
Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida
Apostólica, a religiosa Nicoletta Vittoria Spezzati (já sucedendo outra
freira); e no Pontifício Conselho Justiça e Paz, a leiga Flaminia Giovanello.
Além disso, há doze anos a Pontifícia Academia para as Ciências Sociais é
presidida por mulheres: de 2004 a 2014, Mary Ann Glendon, e desde então,
Margaret Scotford Archer.
No entanto, a
contribuição das mulheres se estende muito além da ocupação de cargos de
direção: o dinamismo das diversas vocações dentro da comunhão eclesial permite
que não seja a hierarquia o critério absoluto dos caminhos que a Igreja toma. A
história dessas doze mulheres atesta isso: sem elas, e muitas outras, a Igreja
católica não seria como a conhecemos hoje.
Priscila e o seu
esposo Áquila eram fabricantes de tendas, assim como Paulo. Por essa razão,
quando o apóstolo chegou à cidade grega de Corinto, decidiu morar e trabalhar
com eles. Depois de um tempo, Paulo viajou para a Síria e eles o acompanharam.
Em uma escala em Éfeso, na atual Turquia, o casal se encontrou com Apolo, um
judeu que já admirava Jesus. A Bíblia diz que eles “o levaram consigo e
expuseram-lhe mais profundamente o caminho do Senhor” (At 8, 26). Apolo
tornou-se então um dos grandes evangelizadores do início do cristianismo. Paulo
diz ainda que o casal arriscou a vida por ele e que todas as comunidades
cristãs dos gentios lhe eram gratas (Rm 16, 4).
Santa Flávia Júlia Helena ou,
simplesmente, Santa Helena (250-330)
Foi a primeira
mulher do imperador romano, Constâncio, tendo sido mãe do seu sucessor,
Constantino, o primeiro imperador romano a se converter ao cristianismo. Também
cristã, Helena fez entre os anos de 327 e 328 uma peregrinação à Terra Santa,
ordenando a construção de igrejas nos lugares da paixão de Cristo. Morreu pouco
depois de voltar de Jerusalém, por volta dos 80 anos de idade. Diz-se que de lá
Helena trouxe algumas relíquias ligadas à paixão, como alguns fragmentos da
cruz, um pedaço da placa colocada sobre a cruz, parte da coroa de espinhos e um
dos pregos, conservadas hoje na Basílica de Santa Cruz em Jerusalém, em Roma,
construída onde antes se localizava o palácio de Helena.
Santa Hilda de Whitby (614-680)
Primeiramente
abadessa de Hartlepool, Hilda fundou no ano de 657 a abadia de Whitby; ambas se
localizavam na costa leste da Grã-Bretanha. Beda, o Venerável, o primeiro a
escrever uma história da Inglaterra, poucas décadas depois da morte de Hilda, a
descreve como uma mulher de grande energia e uma administradora e professora de
grande habilidade. As duas abadias que administrou eram mistas: Hilda era
superiora tanto da comunidade masculina quanto da feminina, que moravam em alas
separadas, mas se reuniam para as orações na igreja abacial. Reis e princesas
buscavam o conselho de Hilda e cinco monges da sua abadia se tornaram bispos.
Santa Hildegarda de Bingen, virgem e
doutora da Igreja (1098-1179)
A abadessa alemã
teve uma produção intelectual impressionante: escreveu sobre medicina,
linguística, música e ciências naturais e compôs música para ser usada na
liturgia de seus mosteiros, bem como o único drama musical medieval cuja letra
e música chegaram aos nossos dias. Muitos se dirigiam a ela para se aconselhar:
conservam-se centenas de cartas dirigidas a bispos, monges, monjas, abades e ao
imperador Frederico Barbarossa, a quem recriminou severamente quando do seu
apoio a três antipapas. No final de sua vida, Hildegarda empreendeu quatro
viagens de pregação, durante as quais fazia sermões em mosteiros, catedrais e
praças, exortando sobretudo os monges e o clero à coerência de vida.
Santa Catarina de Sena (1347-1380)
Obrigada pelos
pais a se casar com o viúvo de sua irmã, Catarina fez um jejum de protesto e,
pressionada a cuidar da aparência para atrair um marido, cortou os cabelos. No
fim, seus pais permitiram que vivesse como bem entendesse: nunca se casou e
nunca foi freira, consagrando-se a uma vida ativa e piedosa fora do convento.
Cuidava de pobres e doentes, viajava e escrevia cartas, orientando questões
políticas e religiosas. Catarina correspondeu-se longamente com o papa Gregório
XI, na época em que o papado estava sediado em Avignon, na França, pedindo-lhe
que voltasse a Roma e reformasse o clero. Florença a enviou – com apenas 29
anos – para resolver uma questão política com o papa e, depois disso, Gregório
voltou a Roma.
Santa Joana d’Arc
“Senhor, vim
conduzir os seus exércitos à vitória”: foi assim que uma piedosa camponesa de
17 anos, vestida de forma masculina, se apresentou ao delfim da França, Carlos,
pretendente ao trono. Joana d’Arc assumiu então o comando militar de quatro mil
soldados, em meio à Guerra dos Cem Anos, uma disputa territorial e dinástica
entre a França e a Inglaterra, e empreendeu a missão de reconquistar a cidade
de Orleans, tomada pelos ingleses havia oito meses – saiu vitoriosa e conduziu
Carlos a Reims, onde foi coroado. Presa depois pelos aliados dos ingleses, foi
submetida a um julgamento que durou mais de um ano, até que foi condenada à
morte e queimada viva em praça pública.
Santa Teresa de Ávila (1515-1582)
A reformadora da
ordem carmelita é provavelmente a mulher de maior destaque em toda a história
da Igreja – se descontarmos aquelas que aparecem na Bíblia. Uma das grandes
personalidades da Reforma Católica, período de reação à Reforma Protestante, Teresa
foi a primeira mulher a ser declarada Doutora da Igreja, em 1970. Seus textos –
Castelo Interior, Caminho de Perfeição e muitos outros – são referência
indispensável para a mística e a espiritualidade cristãs. Em vinte anos, fundou
17 conventos. Essa intensa atividade, por parte de uma mulher e ainda por cima
monja de clausura, valeu-lhe ser investigada pela inquisição e ser chamada de
“inquieta e andarilha” pelo núncio papal na Espanha.
Santa Luísa de Marillac (1591-1660)
Luísa prometeu
na juventude servir somente a Deus, mas seu tutor a usou em uma manobra
política e a obrigou a se casar com um membro da corte francesa. Depois de doze
anos, Luísa enviuvou e passou a ser acompanhada pelo padre Vicente de Paulo,
que pediu para que ela dirigisse os serviços de caridade que um grupo de
senhoras realizavam. Anos depois, ela e quatro mulheres fizeram votos de servir
a Cristo nos pobres: foi o início das Filhas da Caridade, a primeira
congregação de freiras não enclausuradas, que têm “por mosteiro a casa do doente,
por cela um quarto de aluguel, por claustro as ruas da cidade ou as salas dos
hospitais”, nas palavras de Vicente. Em 18 anos, Luísa fundou comunidades em
mais de trinta cidades.
Santa Teresa de Lisieux ou Teresinha do Menino Jesus (1873-1897)
Entre os 35
Doutores da Igreja, encontra-se uma jovem francesa que morreu aos 24 anos. A
monja carmelita Teresa do Menino Jesus não foi uma escritora tão prolífica
quanto a sua xará do século XVI: além de cartas e poemas, escreveu apenas uma
obra, a autobiografia espiritual História de uma alma. Mesmo assim, a sua
influência se espalhou rapidamente após a sua morte e hoje, 119 anos depois,
pode ser comparável à da reformadora espanhola; Teresinha, como é chamada, é
uma das santas de maior devoção na Igreja. O seu ensinamento centra-se na noção
de “pequena via”: a confiança simples que se abandona a Deus como uma criança,
caminho acessível para chegar à santidade.
Santa Maria Faustina Kowalska (1905-1938)
Desde a
experiência de Faustina, ocorrida nos anos 1930, ficou claro que não é possível
deixar de centrar a mensagem da Igreja no anúncio da misericórdia divina. As
visões e os escritos da freira polonesa são um dos principais elementos
responsáveis pela ênfase crescente dada ao tema da misericórdia nas últimas
décadas na Igreja. Foi na sua esteira que João XXIII falou que era hora de a
Igreja usar o “remédio da misericórdia”, na abertura do Concílio Vaticano II;
que João Paulo II escreveu a encíclica Dives in Misericordia e instituiu o
domingo seguinte à Páscoa como “Domingo da Divina Misericórdia”; e que
Francisco proclamou este ano como o Jubileu Extraordinário da Misericórdia.
Beata Teresa de Calcutá (1910-1997)
O seu nome se
tornou sinônimo de bondade desinteressada. Teresa deixou o convento em que
morava na Índia para se dedicar aos mais marginalizados da sociedade,
devolvendo a dignidade a moribundos abandonados nas sarjetas da cidade de
Calcutá. Muitas mulheres se juntaram a ela e a congregação das Missionárias da
Caridade se espalhou pelo mundo. Madre Teresa foi reconhecida mundialmente pelo
trabalho de sua congregação – recebeu, entre outras honras, o Nobel da Paz em
1979. Hoje, a congregação está presente em 133 países com mais de 4.500
religiosas, trabalhando sobretudo junto a refugiados, aidéticos, leprosos,
crianças abandonadas, sem distinção de religião, como fez Madre Teresa desde o
início.
Serva de Deus Chiara Lubich (1920-2008)
Marcada pela
experiência da Segunda Guerra Mundial em sua juventude, Chiara Lubich deu
início a um projeto centrado na espiritualidade da unidade, o Movimento dos
Focolares, hoje presente em 182 países. As suas intuições, que iam de encontro
às necessidades da Igreja em uma sociedade multicultural e multirreligiosa,
anteciparam e acompanharam os passos do Concílio Vaticano II. Foi convidada a
falar na ONU, no Parlamento Europeu, nos sínodos do Vaticano e a grupos de
muçulmanos, judeus, budistas e hindus. Visitando o Brasil, fundou o projeto
“Economia de Comunhão”, que reúne diversos segmentos da sociedade empenhados em
viver uma cultura econômica voltada para a comunhão, em alternativa ao estilo
de vida capitalista.
Fonte: Sempre
Família
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