Na história das deportações encontramos
um capítulo tristíssimo e infelizmente não último, que se refere às devastações
dos sarracenos ao longo das costas italianas e espanholas para saquear e
capturar homens e mulheres, levados à força aos confins da África para serem
vendidos como escravos e depois restituídos aos parentes mediante volumosa soma
de resgate. Nesta calamidade insere-se um capítulo de exultante caridade e
devoção mariana. Em Barcelona, na noite entre 1º e 2 de agosto de 1218, Nossa
Senhora teria aparecido a Pedro Nolasco, um jovem de vinte e nove anos, para
convidá-lo a fundar uma Ordem religiosa com o fim principal de resgatar os
prisioneiros.
Pedro Nolasco nasceu no dia 29 de julho
de 1183, no pequeno povoado de Mas-Saintes-Puelles da Diocese de Saint Paul, no
sul da França, no antigo condado de Languedocentre Tolosa e Carcasona. Seu pai
era um comerciante abastado e sua mãe dona de casa, ambos fervorosos cristãos o
levaram para batizar e lhe impuseram o nome cristão de Pedro.
O pequeno Pedro manifestou sempre uma
doçura como virtude específica. Conta a lenda do seu tempo que, certo dia
estando no berço entrou um enxame de abelhas no quarto onde a criança repousava
tranquila e deixaram um favo de mel nas suas mãozinhas. Sinal da doçura que
destilaria Nolasco durante toda a sua vida.
A época de Pedro Nolasco foi para os
países ao redor do mar Mediterrâneo uma época de guerras religiosas em que se
digladiavam a cruz de Cristo e a meia lua de Mohamed. Semeando a desolação nos
lares mais organizados, tanto de ricos abastados como de pobres, em que muita
gente era aprisionada e feita cativa em nome de Alá (Deus). Algo parecido com o
que acontece hoje com o chamado estado islâmico. Homens e mulheres, adultos,
jovens e crianças, eram submetidos a um duro cativeiro, obrigados a realizarem
trabalhos pesados. As mulheres eram usadas nos mais baixos instintos,
principalmente jovens que eram violentadas. Seres humanos que se tornavam
mercadoria em mãos daqueles que se diziam seus donos.
O pai de Pedro Nolasco transferiu-se
para Barcelona, onde se estabeleceu como rico mercador. O jovem Nolasco
acompanhava seu pai nesta tarefa de mercadejar nas cidades litorâneas onde o
seu pai vendia a mercadoria e muitas vezes Pedro testemunhava os maus tratos
dos infelizes cativos. Alguns desses cativos eram oferecidos também como
mercadoria. A alma de Nolasco se afligia e ele prometia a Deus que aliviaria o
sofrimento destes irmãos abandonados à sorte.
Em 1203, com 20 anos, encontramos Pedro
Nolasco comprando cativos. Dava liberdade aos pobres infelizes, devolvendo-lhes
às suas famílias. Com a morte de seus pais, o jovem Nolasco herdou toda a
fortuna da família a qual renunciou em benefício da redenção dos cativos.
“Ninguém tem maior caridade do que aquele
que dá a vida pelo irmão.” Estas palavras martelavam profundamente a alma do
jovem Nolasco, que unido a outros jovens, moças e rapazes não se entregavam
somente a redenção de cativos, mas gastavam suas horas entre os empestados no
Hospital de Santa Eulália.
Além da invasão árabe entre os
espanhóis, mais uma desgraça se abatia sobre o povo. Uma peste que dizimava as
cidades afetava as multidões sendo insuficiente o atendimento hospitalar (como
hoje o ebola ou a dengue). Então nossos jovens cheios de amor ao próximo
sofredor cuidavam dos enfermos. Este Hospital mais tarde formou parte da
estrutura das redenções, pois os cativos eram levados para uma quarentena e lá
tratados com todo carinho.
Os recursos econômicos minguaram, as
moedas guardadas nos cofres não davam mais para comprar tão rica mercadoria e o
número de cativos cada vez crescia mais. Em certa noite, Nolasco não conseguia
conciliar o sono e pôs-se a rezar e pedir à Mãe do Céu, de quem era profundamente
devoto, que o auxilia-se. Eis que a noite se iluminou e lá estava Maria amorosa
com um branco hábito em suas mãos. “Nolasco”, disse a Mãe de Jesus, “é vontade
de meu filho e vontade minha que fundes uma Ordem religiosa para remir os
cativos. Eis que nós estaremos sempre contigo”. Quando Pedro Nolasco voltou a
si, a linda Senhora havia desaparecido.
Nolasco esperou amanhecer e correu para
contar o sucedido ao seu confessor Raimundo de Penafort e ambos foram contar ao
Rei Dom Jaime I de Aragão e ao bispo de Barcelona Dom Berenguer de Palau que
aprovaram entusiasmados a inspiração de Pedro Nolasco. No dia 02 de agosto de
1218, o rei achou por bem ter uma Organização do reino para redenção dos
cativos, desejo falido do rei Afonso II. Dez dias depois, no dia 10 de agosto
do mesmo ano, a harmonia do órgão e os cantos enchiam a catedral de Barcelona.
Uma nova Ordem religiosa constituía-se
oficialmente e um grupo de jovens de saiotes brancos proclamavam as grandezas
de Deus por meio de Maria Santíssima e emitiam três votos comuns às ordens
religiosas: dominicanos, franciscanos, servitas, agostinianos, trinitários e
etc.
Mas a vontade daquele grupo movido pela
caridade ainda gritara, perante os fieis reunidos no templo, um quarto voto:
“daremos nossas vidas, se necessário for, para tirar do cativeiro um irmão
necessitado”. A regra deles, redigida sob a direção de são Raimundo de Penafort,
exigia o Voto heroico que custou à Ordem Mercedária alguns milhares de vidas e
muito sangue derramado, imitando assim o Redentor dos homens, Jesus, que São
Pedro Nolasco tão bem imitou durante toda a sua vida. Esse voto obrigava a
oferecer-se como escravo dos muçulmanos, quando necessário, para livrar um
cristão em perigo de apostasia. Dos vinte e seis mil prisioneiros libertados
por mercedários, no seu primeiro século de vida, nada menos que 890 foram
resgatados e reconduzidos à pátria por Pedro Nolasco. Mas ele não se limitava a
estabelecer com os mouros o preço do resgate. A um preço bem mais árduo de
sofrimentos, torturas, prisões, Pedro Nolasco pregava o Evangelho aos infiéis,
arriscando a própria vida.
Esta Ordem recebeu muitos nomes.
Chamou-se Ordem de Santa Eulália; Ordem das Mercês dos cativos, Ordem da
Redenção dos cativos; Ordem das Mercês. Desde 1272 o verdadeiro nome é: Ordem
da Virgem Maria das Mercês da Redenção dos Cativos.
Logo apareceu a Rama feminina, as
freiras, fundada por Santa Maria de Cervellón, com um grupo de moças que
ajudaram muito a Pedro Nolasco e a seus religiosos orando na capela pelo êxito
da redenção.
São Pedro Nolasco preocupou-se sempre em
ser fiel imitador de Cristo, não só na caridade, mas também nos gestos e
atitudes. Este varão de Deus dedicou toda a sua vida a serviço do próximo vendo
em cada sofredor o próprio Cristo. Os historiadores mais recentes dizem que ele
morreu em Barcelona, no dia 06 de maio de 1245.
Para melhor realizar sua missão, sua “equipe”
se constituía de clérigos, irmãos de obediência; donatos (leigos serventes de
convento de frades e que usam hábito), amigos piedosos que permaneciam com os
religiosos ajudando nos vários serviços domésticos e mais tarde emitiam os
votos; terciários, leigos que viviam com sua família, mas participavam dos bens
espirituais da Ordem, e em momentos determinados da história fez-se mister
grupos armados para defender os navios ou outros transportes dos cativos da
pirataria. Viviam em seus castelos e usavam armas. Às vezes eram requisitados
pelo rei para exercer sua guarda.
A missão principal de todos era recolher
esmolas para pagar o resgate de cativos. Que muitas vezes era insuficiente e,
se o cativo estivesse numa situação grave, um ou dois redentores deveria ficar
como refém até ser resgatado.
É grande o número de religiosos que
deram a vida para salvar os cativos. São Raimundo Nonato, São Pedro Armengol, São
Serápio, São Pedro Pascual, São Juán Gilaber Jofré, e alguns milhares dos quais
desconhecemos os nomes, mas estão escritos no céu. Entre os anos 1302 e 1489
foram feitas aproximadamente 153 redenções em que foram resgatados 18.623,
segundo dados do historiador Garí e Siumell.
Após a aparição da Virgem, num momento
de encanto, Nolasco viu uma frondosa árvore. Mas logo chegaram uns desalmados
com foices e machados e começaram a decepar os galhos, porém, quanto mais
galhos eram derrubados, mais rebentos nasciam. Esta visão foi prenúncio da
expansão no mundo do carisma do fundador que dividido em forma de associações e
grupos religiosos, tornou-se presente na Igreja a obra redentora de Cristo.
São Pedro Nolasco foi um homem
destemido, profundamente conhecedor das questões sociais e políticas do seu
tempo, exímio articulador e organizador de expedições para resgatar cativos.
Homem que sabia usar bem as estratégias do seu tempo para alcançar seus objetivos.
Diz a história que quando seu dinheiro acabou, ele criou uma campanha de
arrecadação de recursos pelas esquinas da cidade de Barcelona, colocando arcas
de redenção, onde as pessoas depositavam doações. Nolasco havia conseguido
também uma autorização do Bispo para sair pelas igrejas pregando e conseguindo
mais recursos. Nolasco era um homem que transitava no palácio do Rei, nos
ambientes mais ricos, sem deixar jamais de viver de forma humilde entre os mais
pobres.
Em 1256, ele partiu para a glória
sabendo que ele, seus filhos espirituais e sua ordem – que foi abençoada pela
Igreja e reconhecida pelo rei – já tinham resgatado muitos cristãos da
escravidão.
Assim, era um santo, homem de profunda
oração, muito mariano e com vocação heróica. Nunca foi ordenado sacerdote,
morreu leigo (religioso), preferindo ser chamado de frei Pedro Nolasco, pela
sua simplicidade. A Ordem também não recebeu seu nome, e sim o nome da Mãe de
Jesus, com título de Mercês.
Os mercedários, como são chamados os que
pertencem à Ordem fundada por São Pedro Nolasco, atualmente trabalham entre os
encarcerados, nas missões e na ação pastoral junto ao povo e à juventude. São Pedro Nolasco é considerado protetor dos encarcerados.
Que São Pedro Nolasco nos ajude a viver
o espírito do Cristo Redentor nos dias de hoje.
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