Muitas
vezes as vias de Deus são incompreensíveis aos olhos humanos. Mas Ele sabe como
conduzir as almas e os acontecimentos para realizar Seu plano de amor e
salvação.
Dotada de um
caráter fácil e submisso, com uma marcada propensão para fazer o bem aos
outros, a pequena descendente da tribo dos Dagiu dava, desde a mais tenra
infância, mostras de ser uma predileta de Deus .
Certa vez,
estando com uma amiga nas proximidades de sua aldeia, situada na região de
Darfur, no oeste do Sudão, Bakhita deparou-se com dois homens que surgiram de
improviso de trás de uma cerca. Um deles pediu-lhe que fosse pegar um pacote
que esquecera no bosque vizinho e disse à sua companheira que podia continuar o
caminho, pois ela logo a alcançaria. "Eu
não duvidava de nada, obedeci imediatamente, como sempre fazia com a minha
mãe" - narrou ela.1
Protegidos pela
floresta e longe de qualquer testemunha importuna, os dois estrangeiros
agarraram a menina e levaram-na à força com eles, ameaçando-a com um punhal.
Sua ingenuidade, bem compreensível em seus oito anos, custara-lhe caro.
Contudo, eram
essas as misteriosas vias da Providência, por meio das quais se realizariam os
desígnios de Deus a seu respeito. Se tal fato não tivesse ocorrido talvez sua
vida teria continuado na normalidade do convívio familiar, em meio aos afazeres
domésticos e às práticas rituais do culto animista que professavam seus
parentes. Provavelmente ela jamais conheceria a Fé Católica, e permaneceria
submersa nas trevas do paganismo.
Uma escravidão providencial
Empurrada
violentamente por seus raptores, foi levada para uma cruel e penosa escravidão.
E, embora ela o ignorasse, estava dando os primeiros passos que a conduziriam,
à custa de sofrimentos atrozes, rumo à verdadeira liberdade de espírito e ao
encontro com o grande Senhor a Quem já amava antes de conhecer.
Sim, desde muito
pequena, Bakhita deleitava-se em contemplar o Sol, a Lua, as estrelas e as
belezas da natureza, perguntando-se maravilhada:
"Quem é o ‘patrão’ destas coisas tão bonitas? E
sentia uma grande vontade de vê-lo, de conhecê-lo, de prestar-lhe
homenagem".
Ensina São Tomás
de Aquino que "uma pessoa pode
conseguir o efeito do Batismo pela força do Espírito Santo, sem Batismo de água
e até sem Batismo de sangue, quando seu coração é movido pelo Espírito Santo a
crer e amar a Deus e a arrepender-se de seus pecados".2 É o que se
chama Batismo "de desejo",
ou "de penitência" . Apoiando-nos nessa doutrina, podemos supor que
na alma admirativa da escrava sudanesa brilhava a luz da graça santificante, muito
antes de ela receber o Batismo sacramental.
Para Bakhita,
porém, apenas começara a terrível série de padecimentos que se prolongaria
durante 10 anos. Tal foi o choque produzido em seu espírito pela violência do
sequestro, que ela esqueceu-se até do próprio nome. Assim, quando foi
interrogada pelos bandidos, não pôde pronunciar sequer uma palavra. Então um
deles disse-lhe: "Muito bem...
Chamar-te-emos Bakhita". Em sua voz havia um acento irônico, uma vez
que este nome, em árabe, significa "afortunada".
Padecimentos no cativeiro
Chegando a um
povoado, Bakhita foi introduzida numa cabana miserável e trancada num quarto
estreito e escuro, onde permaneceu durante um mês. "Quanto eu tenha sofrido naquele lugar, não se pode dizer com as
palavras", escreveria ela mais tarde. Por fim, depois desses dias nos
quais a porta não se abria senão para deixar passar um parco alimento, a
prisioneira pôde sair, não para ser posta em liberdade, mas para ser entregue a
um traficante de escravos que acabava de adquiri-la.
Bakhita haveria
de ser vendida cinco vezes sucessivas,
aos mais variados patrões, exposta nos mercados, presa pelos pés a pesadas
correntes e obrigada a trabalhar sem descanso para satisfazer os caprichos de
seus amos. Colocada a serviço da mãe e da esposa de um general, a jovem escrava
ali enfrentou os piores anos de sua existência, como ela mesma descreve: "As chicotadas caíam em cima de nós sem
misericórdia; de modo que nos três anos que estive a serviço deles, não me lembro
de ter passado um só dia sem feridas, porque não havia ainda sarado dos golpes
recebidos e recebia outros ainda, sem saber a causa. [...] Quantos maus tratos os escravos recebem sem
nenhum motivo! [...] Quantas
companheiras minhas de desventura morreram pelos golpes sofridos"!
Além desses e de
outros tormentos, fizeram-lhe uma tatuagem que a obrigou a permanecer imóvel
sobre sua esteira por mais de um mês. Bakhita conservou até o fim da vida 144 cicatrizes sobre o corpo, além de
um leve defeito ao caminhar.
Certa vez,
interrogada sobre a veracidade de tudo quanto fora contado a seu respeito, ela
afirmou ter omitido em suas narrativas detalhes verdadeiramente espantosos,
vistos apenas por Deus e impossíveis de serem ditos ou escritos. Entretanto, a mão
do Senhor não a abandonou sequer um instante. Mesmo nos piores momentos,
Bakhita sentia dentro de si uma força misteriosa que a sustentava, impelindo-a
a comportar-se com docilidade e obediência, sem nunca se desesperar.
Proteção amorosa de Deus
Anos mais tarde,
lançando um olhar sobre seu passado, reconhecia a intervenção divina nos
acontecimentos de sua vida: "Posso
dizer realmente que não morri por um milagre do Senhor, que me destinava a
coisas melhores". E a Ele manifestava sua gratidão: "Se eu ficasse de joelhos a vida
inteira, não diria, nunca, o bastante, toda a minha gratidão ao bom Deus".
Prova dessa
proteção amorosa de Deus, que a acompanhou desde a infância, foi a preservação
de alma e de corpo na qual se manteve, mesmo em meio às torturas, sem que
jamais sua castidade fosse atingida. "Eu
estive sempre no meio da lama, mas não me sujei. [...] Nossa Senhora me protegeu, ainda que eu não A conhecesse. [...] Em várias ocasiões me senti protegida por um
ser superior".
A mudança para a Itália
Em 1882, o
general que a comprara teve de retornar à Turquia, seu país, e pôs à venda seus
numerosos escravos Bakhita, fazendo jus a seu nome, logo despertou a simpatia
do cônsul italiano Calixto Legnani, que se dispôs a adquiri-la. "Desta vez fui verdadeiramente
afortunada, porque o novo patrão era bastante bom e começou a querer-me tanto
bem".
Embora o cônsul
não pareça ter-se esforçado em iniciar nas verdades da Fé a jovem escrava,
durante os anos em que esta viveu em sua casa, este período foi para ela a
aurora do encontro com a Igreja. Como católico que era, Legnani tratou Bakhita
com bondade. Ali não havia castigos, pancadas, nem mesmo repreensões, e ela
pôde gozar da doçura característica das relações entre aqueles que procuram cumprir
os mandamentos da caridade cristã.
Ante o avanço de
uma revolução nacionalista no Sudão, Calixto Legnani teve de voltar para a
Itália. A pedido de Bakhita, levou-a consigo. Porém, chegados a Gênova, o
cônsul cedeu a jovem sudanesa a seus amigos, o casal Michieli. Assim, ela
passou a morar na residência desta família, em Mirano, na região do Veneto,
tendo por encargo especial o cuidado da filha, a pequena Mimina.
O encontro com seu verdadeiro Patrão e
Senhor
Estando ali,
Bakhita recebeu de um amável senhor, que se interessara por ela, um belo
crucifixo de prata: "Explicou-me que
Jesus Cristo, Filho de Deus, tinha morrido por nós. Eu não sabia quem fosse
[...]. Recordo que às escondidas o olhava
e sentia uma coisa em mim que não sei explicar". Pouco a pouco, a
graça foi trabalhando a alma sensível da ex-escrava africana, abrindo-a para as
realidades sobrenaturais que ela desconhecia.
Em sua Encíclica
Spe Salvi, o Santo Padre Bento XVI
assim descreve o milagre que se operou no interior de Bakhita: "Depois de ‘patrões' tão terríveis que
a tiveram como sua propriedade até agora, Bakhita acabou por conhecer um
‘patrão' totalmente diferente - no dialeto veneziano que agora tinha aprendido,
chamava ‘Paron' ao Deus vivo, ao Deus de Jesus Cristo. Até então só tinha
conhecido patrões que a desprezavam e maltratavam ou, na melhor das hipóteses,
a consideravam uma escrava útil. Mas agora ouvia dizer que existe um ‘Paron'
acima de todos os patrões, o Senhor de todos os senhores, e que este Senhor é
bom, a bondade em pessoa. Soube que este Senhor também a conhecia, tinha-a
criado; mais ainda, amava-a. Também ela era amada, e precisamente pelo ‘Paron'
supremo, diante do qual todos os outros patrões não passam de miseráveis servos.
Ela era conhecida, amada e esperada; mais ainda, este Patrão tinha enfrentado
pessoalmente o destino de ser flagelado e agora estava à espera dela ‘à direita
de Deus Pai'".3
Uma inesperada decisão cheia de
valentia
Mais sofrimentos
ainda a aguardavam, embora de ordem muito diversa dos anteriormente suportados:
Deus lhe pediria uma prova de sua entrega, de sua renúncia a tudo, em razão do
amor a Ele, oferecida de livre e espontânea vontade.
Quando Bakhita,
já instruída na Religião Católica pelas Irmãs Canossianas de Veneza,
preparava-se para receber o Batismo, sua patroa quis levá-la de novo ao Sudão,
onde a família Michieli resolvera fixar-se definitivamente. De caráter flexível
e submisso, acostumada a se considerar propriedade de seus donos, revelou ela,
naquela conjuntura, uma coragem até então desconhecida mesmo pelos seus mais
próximos. Temendo que aquela volta pusesse em risco sua perseverança, negou-se
a seguir sua senhora.
As promessas de
uma vida fácil, a perspectiva de rever sua pátria, a profunda afeição a Mimina
e a gratidão a seus amos, nada disso pôde mudar sua decisão de dar-se a Jesus
Cristo para sempre. Bakhita mostrara-se sempre dócil a seus superiores. Agora
manifestava de outra forma essa virtude, obedecendo mais a Deus do que aos
homens (cf. At 4, 19). "Era o Senhor
que me infundia tanta firmeza, porque queria fazer-me toda sua".
A entrega definitiva a Deus
Tendo saído
vitoriosa dessa batalha, Bakhita foi batizada, crismada e recebeu a Eucaristia
das mãos do Patriarca de Veneza, no dia 09 de janeiro de 1890. Foram-lhe postos
os nomes de Josefina Margarida Afortunada. "Recebi o santo Batismo com uma alegria que só os Anjos poderiam
descrever", narraria mais tarde.
Pouco depois,
querendo selar sua entrega a Deus de maneira irreversível, solicitou seu
ingresso no Instituto das Filhas da Caridade, fundado por Santa Madalena de
Canossa, a quem devia sua entrada na Igreja. Na festa da Imaculada Conceição,
em 1896, após cumprir seu noviciado com exemplar fervor, Josefina pronunciou
seus votos na Casa-Mãe do Instituto, em Verona.
A partir daí, sua
vida foi um constante ato de amor a Deus, um dar-se aos outros, sem restrições,
nem reservas. Ora encarregada de funções humildes, como a cozinha ou a
portaria, ora enviada em missão através da Itália, a santa sudanesa aceitava
com verdadeira alegria tudo quanto lhe ordenavam, conquistando a simpatia
daqueles que a rodeavam, sem se cansar de dizer: "Sede bons, amai o Senhor, rezai por aqueles que não O
conhecem".
Sobre o espírito
missionário de Bakhita comenta Bento XVI em sua encíclica: "A libertação recebida através do encontro com o Deus de Jesus
Cristo, sentia que devia estendê-la, tinha de ser dada também a outros, ao
maior número possível de pessoas. A esperança, que nascera para ela e a
‘redimira', não podia guardá-la para si; esta esperança devia chegar a muitos,
chegar a todos".4
Submissão até o fim
Por fim, após
mais de 50 anos de frutuosa vida religiosa, durante os quais suas virtudes se
acrisolaram no fogo da caridade, Bakhita sentiu a morte aproximar-se. Atacada
por repetidas bronquites e pneumonias que foram minando sua saúde, suportou
tudo com fortaleza de ânimo. Em suas últimas palavras, proferidas pouco antes
de seu falecimento, deixou transparecer o gozo que lhe enchia a alma: "Quando uma pessoa ama tanto uma outra,
deseja ardentemente ir para junto dela: por que, então, tanto medo da morte? A
morte nos leva a Deus".
Em 8 de
fevereiro de 1947, a Irmã Josefina recebeu os últimos Sacramentos, acompanhando
com atenção e piedade todas as orações. Avisada de que aquele dia era um
sábado, seu semblante pareceu iluminar-se e exclamou com alegria: "Como estou contente! Nossa Senhora,
Nossa Senhora”! Foram estas suas últimas palavras antes de entregar
serenamente sua alma e encontrar-se face a face com o "Paron", que
desde pequenina ansiava por conhecer.
Seu corpo,
transladado para junto da igreja, foi objeto da veneração de numerosos fiéis,
que durante três dias ali afluíram,
desejosos de contemplar pela última vez a querida Madre Moretta, como era
carinhosamente conhecida, que com tanta bondade os tratara sempre. Miraculosamente,
seus membros conservaram-se flexíveis
durante esse período, sendo possível mover seus braços para pôr sua mão sobre a
cabeça das crianças.
Por este meio,
Santa Josefina Bakhita revelava o grande segredo de sua santidade, refletido em
seu próprio corpo. A via pela qual Deus a chamara fora a da submissão heroica à
vontade divina e, para a posteridade, ela deixava um modelo a ser seguido. A
humildade, a mansidão e a obediência transparecem em suas palavras, numa
disposição verdadeiramente sublime de sua alma: "Se encontrasse aqueles negreiros que me raptaram, e mesmo aqueles
que me torturaram, ajoelhar-me-ia para beijar as suas mãos; porque, se isto não
tivesse acontecido, eu não seria agora cristã e religiosa".
1 Salvo
indicação em contrário, todas as citações entre aspas pertencem a DAGNINO, Ir.
Maria Luísa, Bakhita racconta la sua storia. Trad . Cecília Maríngolo,
Canossiana. Roma: Città Nuova, 1989. p. 38 .
2 Cf. Suma
Teológica, III, q. 66, a.11 .
3 BENTO XVI,
Carta Encíclica Spe Salvi, 30/11/2007, n. 3 .
4 BENTO XVI,
Carta Encíclica Spe Salvi, 30/11/2007, n. 3
(Revista dos
Arautos, Fev/2009, n. 86, p. 34 à 38)
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Segundo texto biográfico: site do Vaticano
JOSEFINA
BAKHITA (1869-1947)
Religiosa sudanesa da Congregação das Filhas da
Caridade (Canossianas)
Irmã
Josefina Bakhita nasceu no Sudão (África), em 1869 e morreu em Schio
(Vicenza-Itália) em 1947. Flor
africana, que conheceu a angústia do rapto e da escravidão, abriu-se
admiravelmente à graça junto das Filhas de Santa Madalena de Canossa, na
Itália.
A irmã morena
Em
Schio, onde viveu por muitos anos, todos ainda a chamam«a nossa Irmã Morena». O processo para a causa de Canonização
iniciou-se doze anos após a sua morte e no dia 1 de dezembro de 1978, a Igreja
emanava o Decreto sobre a heroicidade das suas virtudes.
A
Providência Divina que «cuida das flores do campo e dos pássaros do céu», guiou
esta escrava sudanesa, através de inumeráveis e indizíveis sofrimentos, à
liberdade humana e àquela da fé, até a consagração de toda a sua vida a Deus,
para o advento do Reino.
Na escravidão
Bakhita
não é o nome recebido de seus pais ao nascer. O susto provado no dia em que foi
raptada, provocou-lhe alguns profundos lapsos de memória. A terrível
experiência a fizera esquecer também o próprio nome.
Bakhita,
que significa «afortunada», é o nome que lhe foi imposto por seus raptores. Vendida e comprada várias vezes nos mercados de
El Obeid e de Cartum, conheceu as humilhações, os sofrimentos físicos e morais
da escravidão.
Rumo à liberdade
Na
capital do Sudão, Bakhita foi, finalmente, comprada por um Cônsul italiano, o
senhor Calixto Legnani. Pela primeira vez, desde o dia em que fora raptada,
percebeu com agradável surpresa, que ninguém usava o chicote ao lhe dar ordens
mas, ao contrário, era tratada com maneiras afáveis e cordiais. Na casa do
Cônsul, Bakhita encontrou serenidade, carinho e momentos de alegria, ainda que
sempre velados pela saudade de sua própria família, talvez perdida para sempre.
Situações
políticas obrigaram o Cônsul a partir para a Itália. Bakhita pediu-lhe que a
levasse consigo e foi atendida. Com eles partiu também um amigo do Cônsul, o
senhor Augusto Michieli.
Na Itália
Chegados
em Gênova, o Sr. Legnani, pressionado pelos pedidos da esposa do Sr. Michieli,
concordou que Bakhita fosse morar com eles. Assim ela seguiu a nova família
para a residência de Zeniago (Veneza) e, quando nasceu Mimina, a filhinha do
casal, Bakhita se tornou para ela babá e amiga.
A compra
e a administração de um grande hotel em Suakin, no Mar Vermelho, obrigaram a
esposa do Sr. Michieli, dona Maria Turina, a transferir-se para lá, a fim de
ajudar o marido no desempenho dos vários trabalhos. Entretanto, a conselho de
seu administrador, Iluminado Checchini, a criança e Bakhita foram confiadas às
Irmãs Canossianas do Instituto dos Catecúmenos de Veneza. E foi aqui que, a seu
pedido, Bakhita, veio a conhecer aquele Deus que desde pequena ela «sentia no
coração, sem saber quem Ele era».
«Vendo o
sol, a lua e as estrelas, dizia comigo mesma: Quem é o Patrão dessas coisas tão
bonitas? E sentia uma vontade imensade vê-Lo, conhecê-Lo e prestar-lhe
homenagem».
Filha de Deus
Depois
de alguns meses de catecumenato, Bakhita recebeu os Sacramentos de Iniciação
Cristã e o novo nome de Josefina. Era o dia 9 de janeiro de 1890. Naquele dia
não sabia como exprimir a sua alegria. Os seus olhos grandes e expressivos
brilhavam revelando uma intensa comoção. Desse dia em diante, era fácil vê-la
beijar a pia batismal e dizer: «Aqui me tornei filha de Deus!».
Cada
novo dia a tornava sempre mais consciente de como aquele Deus, que agora
conhecia e amava, a havia conduzido a Si por caminhos misteriosos, segurando-a
pela mão.
Quando
dona Maria Turina retornou da África para buscar a filha e Bakhita, esta, com
firme decisão e coragem fora do comum, manifestou a sua vontade de permanecer
com as Irmãs Canossianas e servir aquele Deus que lhe havia dado tantas provas
do seu amor.
A jovem
africana, agora maior de idade, gozava de sua liberdade de ação que a lei
italiana lhe assegurava.
Filha de Madalena
Bakhita
continuou no Catecumenato onde sentiu com muita clareza o chamado para se
tornar religiosa e doar-se totalmente ao Senhor, no Instituto de Santa Madalena
de Canossa.
A 8 de
dezembro de 1896, Josefina Bakhita se consagrava para sempre ao seu Deus, que
ela chamava com carinho «el me Paron!».
Por mais
de 50 anos, esta humilde Filha da Caridade, verdadeira testemunha do amor de
Deus, dedicou-se às diversas ocupações na casa de Schio.
De fato,
ela foi cozinheira, responsável do guarda-roupa, bordadeira, sacristã e
porteira. Quando se dedicou a este último serviço, as suas mãos pousavam
docemente sobre a cabecinha das crianças que, diariamente, freqüentavam as
escolas do Instituto. A sua voz amável, que tinha a inflexão das nênias e das
cantigas da sua terra, chegava prazerosa aos pequeninos, reconfortante aos
pobres e doentes e encorajadoras a todos os que vinham bater à porta do
Instituto.
Testemunha do Amor
A sua
humildade, a sua simplicidade e o seu constante sorriso, conquistaram o coração
de todos os habitantes de Schio. As Irmãs a estimavam pela sua inalterável
afabilidade, pela fineza da sua bondade e pelo seu profundo desejo de tornar
Jesus conhecido.
«Sede bons, amai a Deus, rezai por aqueles que
não O conhecem. Se, soubésseis que grande graça é conhecer a Deus!».
Chegou a
velhice, chegou a doença longa e dolorosa, mas a Irmã Bakhita continuou a
oferecer o seu testemunho de fé, de bondade e de esperança cristã. A quem a
visitava e lhe perguntava como se sentia, respondia sorridente: «Como o Patrão quer».
A última prova
Na
agonia reviveu os terríveis anos de sua escravidão e vária vezes suplicava à
enfermeira que a assistia: «Solta-me as
correntes ... pesam muito!».
Foi
Maria Santíssima que a livrou de todos os sofrimentos. Assuas últimas palavras
foram: «Nossa Senhora! Nossa Senhora!»,
enquanto o seu último sorriso testemunhava o encontro com a Mãe de Jesus.
Irmã
Bakhita faleceu no dia 8 de fevereiro de 1947, na Casa de Schio, rodeada pela
comunidade em pranto e em oração. Uma multidão acorreu logo à casa do Instituto
para ver pela última vez a sua «Santa
Irmã Morena», e pedir-lhe a sua proteção lá do céu. Muitas são as graças alcançadas por sua
intercessão.
Um comentário:
🙏🏻 que história tocante!
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