1. Vida
São Basílio
é o único dos Padres capadócios distinguido com o sobrenome de “Grande”. O
título é justificado por suas extraordinárias qualidades como estadista e
organizador eclesiástico, como expoente egrégio da doutrina católica e como um
segundo Atanásio na defesa da ortodoxia. Além de ser considerado como o Pai
do monaquismo oriental e reformador da liturgia.[1]
São Basílio nasceu cerca de 330, de pais
nobres, ricos e piedosos, em Cesareia da Capadócia. A quantidade de santos
existentes em sua família é impressionante: seu pai e sua mãe são santos; seu
avô foi mártir, sua avó é Santa Macrina a Anciã; seus bisavós eram São Basílio
o Ancião, e Santa Emélia; além de três irmãos: Santa Macrina a Jovem, São
Pedro, Bispo de Sebaste, e São Gregório, Bispo de Nissa.[2]
Os grandes amigos: São Basílio Magno e São Gregório de Nazianzo. |
Realizou
seus primeiros estudos em Cesareia, com seu pai, seguindo depois para
Constantinopla e Atenas, onde encontra São Gregório Nazianzeno, com o qual se
unirá em amizade estreita durante os difíceis combates do tempo. Um de seus
companheiros de estudo chamava-se Juliano, ao qual, mais tarde, a História dará
o triste epíteto de “Apóstata”.
Quando
Basílio voltou a Cesaréia, em 356, recebeu o Batismo e o leitorado. Após isto,
decidiu vender os seus bens – uma boa quantidade – a fim de levar uma vida
solitária. Pouco durou sua solidão, pois um grande número de pessoas se lhe
juntaram, a fim de levarem vida monástica. Daí surgiu a instituição monacal basiliana, para qual, junto com São
Gregório Nazianzeno, São Basílio comporá duas regras que, juntamente com a de
São Pacômio será a base da vida monástica do oriente, como a de São Bento será
para o ocidente.
Para tal
institucionalização da vida monacal, empreendeu longas viagens: Síria,
Palestina, Mesopotâmia, Egito, visitando cenóbios, mosteiros, a fim de deles
colher inspiração.
Sua vida
monacal, continuada depois destas viagens, foi interrompida em 364 pelo apelo
de Eusébio, bispo de Cesaréia, que o chamou para colaborador e conselheiro. Em
370 sucede a Eusébio, tornando-se o exarca da importante diocese do Ponto.[3]
Nesta função
procurou de todos os modos, acabar com o arianismo, que vivia uma época de
prestígio, graças ao imperador Valente. Este, tomando conhecimento da posição
de São Basílio, procurou de todas as formas amedrontá-lo, mas em vão. Primeiro,
enviou o prefeito Modesto para ameaçá-lo. Este, após as firmes e inflexíveis
respostas de São Basílio, exclamou com arrogância: “Nunca ninguém me falou
desta maneira!” Ao que retrucou Basílio: “É
porque ainda não te havias confrontado com um bispo!”.
Após este
fracasso de Modesto, Valente procurou ser mais violento: dividiu a diocese de
São Basílio, aumentando o poder dos arianos. Porém, mais que Valente para o
mal, o santo bispo de Cesaréia era infatigável para a causa de Nosso Senhor
Jesus Cristo.
Neste tempo,
as coisas estavam de tal forma no oriente que pouquíssimos bispos ainda se
mantinham unidos a Roma. União com Roma: eis uma das grandes missões de São
Basílio. Tentou-a através do grande Santo Atanásio, que o ajudou durante pouco
tempo, pois sua missão na terra já se realizara sendo chamado à glória de
Cristo cuja divindade defendeu durante toda sua vida. Não desistiu o Santo
exarca, enviando homens de confiança a um sem número de lugares. Obteve êxito
extraordinário, como se verificou no sínodo de Ilíara do ano 375, onde, na
presença de Valentiniano, se juntaram muitos bispos ocidentais e tomaram o
partido de São Basílio. A partir de então seu prestígio não fez senão crescer,
sendo a ocasião perfeita para combater o apolinarismo, o macedonianismo, e o
arianismo – este último, segundo a visão de Eunômio.
Entretanto,
Deus, em seus insondáveis desígnios, chamou-o a si em 379, quando ele contava
apenas 50 anos.[4]
Os frutos de
seus esforços logo se fizeram sentir: poucos meses depois de sua morte, num
Sínodo de Antioquia, se chegava a uma concórdia entre a Igreja Oriental e
Ocidental.[5]
Ao Magno
Capadócio, podem se aplicar suas próprias palavras a respeito de Jó: “Campeão imbatível, que suportou violentos
assaltos do demônio, semelhantes ao ímpeto de uma torrente, com ânimo
imperturbável e com propósito irremovível; e nas tentações tanto se mostrou
superior, quanto maiores e árduas apareciam as lutas que empreendeu com o
adversário.”[6]
2. Obras
Suas obras
são: Contra Eunômio; Sobre o Espírito Santo; Moralia (Τα ήθικά); duas regras monásticas; Ad adolescentes; Homilias e sermões; In Hexaemeron; Homilias sobre os salmos; Comentários sobre Isaías; Alguns
outros sermões e um enorme número
de cartas.
3.1.
Doutrina Trinitária
Para os
redatores do Credo de Niceia, entre os quais Santo Atanásio, não havia a
distinção entre Ousía e Hypostasis, o que ocasionou muitas controvérsias. São
Basílio foi o primeiro a fazer a distinção: em
Deus há uma Ousía e três Hypostasis.
“Para ele, ousía significa existência ou identidade
substancial de Deus, enquanto que hipóstase
quer dizer a existência de uma forma
particular, a maneira de ser de cada
uma das Pessoas.”[7]
Tudo isto,
servirá de base para o Concílio de Calcedônia (451).
3.2 Cristologia
Quanto à
cristologia, São Basílio não fez senão reafirmar e esclarecer o que fora
definido em Nicéia. Assim afirmou ele: “Não
podemos acrescentar nada ao Credo e Nicéia, nem sequer a coisa mais leve, fora
a glorificação do Espírito Santo, e isto porque nossos pais mencionaram este
tema incidentalmente.” (Ep. 258,2).[8]
A mesma
distinção entre Hipóstases e Ousía, usada para a doutrina trinitária, servirá
para a cristologia. Refutando aos partidários do Homoiousios, escreve: “Confessa uma só ousía nos dois [Pai e
Filho] para não cair no politeísmo.”[9]
Entretanto,
uma das mais importantes distinções que fez, foi sobre o conceito de Relação.
Na polêmica
contra Eunômio, o qual afirmava que o caráter próprio da divindade é de ser “não gerado”, São Basílio explica que os nomes Pai e Filho, não definem a essência (Ousía), mas, sim, a ‘relação’ entre Eles. São
Basílio emprega o termo ‘relação’ no sentido que Aristóteles dá em suas
categorias. Assim, o nome de homem, mineral, animal, dizem respeito à essência
do ser. Já pai, esposo, escravo, dizem respeito à ‘relação’, pois nenhum homem
seria pai sem ter filho, esposo sem esposa, ou escravo sem senhor. Desta forma,
dizer que o Filho não é gerado, ou não é eterno, vale a dizer
que o Pai nem sempre foi Pai, pois se não havia Filho, esta
relação de paternidade, em algum momento não existiu.
Cair-se-ia num ciclo vicioso…
Com esta
explicitação, São Basílio iluminou toda a teologia trinitária e cristológica
com um brilho difícil de ser superado, e desferiu o ‘golpe de misericórdia’ no
arianismo.
3.3. A Divindade do Espírito Santo
O Concílio
de Niceia, convocado para discutir a doutrina de Ario sobre a divindade do
Filho, não enfrentara o problema da divindade do Espírito Santo.
São Basílio
defendia a divindade do Espírito Santo de maneira firme, mas prudente. Para não
criar rivalidades mais crônicas do que as já havidas com os arianos, e assim
causar mais divisões na Igreja, ele afirmava a divindade da Terceira
Hypóstasis, com argumentos cautelosos. Afirma que se o Batismo, cuja
fórmula foi instituída pelo próprio Senhor Jesus, é realizado em
nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, significa
que este último não é alheio à divindade das outras duas Pessoas. Portanto,
o Espírito Santo não é criatura.
A partir
desta afirmação, acusaram-lhe de dar ao Espírito Santo uma prerrogativa que é
exclusiva do Pai: a de “não gerado”. Isto ocasionou que – alguns afirmam que
por primeira vez, antes mesmo de São Gregório Nazianzeno – São Basílio
empregasse o termo “procede”, tirado do Evangelho de São João 15, 26,
por primeira vez em sentido técnico.
Entretanto,
o Espírito Santo não foi declarado explicitamente Deus, pois isto nas Sagradas
Escrituras é apenas vislumbrado. Mas a doutrina de São Basílio e dos outros capadócios
será a base para o Concílio de Constantinopla, onde a divindade do Espírito
Santo será definitivamente expressada.
Digna de
menção é esta da passagem de sua obra Sobre o Espírito Santo: “Substância inteligente, de poder infinito,
grandeza ilimitada, fora do tempo e dos
séculos, em nada ciosa de seus próprios bens. Para ele [Espírito Santo] voltam-se
todos os que anseiam pela santificação, para ele se dirigem os anelos dos que
vivem segundo a virtude, quantos recebem o refrigério de seu sopro, e são
amparados para alcançar o fim adequado a sua natureza. Aperfeiçoa os outros,
enquanto Ele mesmo de nada carece. Não é um ser vivo que precise se refazer; ao
contrário é provedor de vida. Não aumenta progressivamente, mas logo possui a
plenitude; é consistente por si mesmo, está em toda parte. Origem da
santificação, luz inteligível, concede por si mesmo certa iluminação a toda
faculdade racional, a fim de que descubra a verdade. Inacessível por sua
natureza, faz-se, contudo, inteligível, por bondade.”[10]
3.4. Eucaristia
Além de
seguir toda a doutrina tradicional da presença real de Nosso Senhor Jesus
Cristo nas espécies do pão e do vinho, São Basílio menciona o costume da comunhão
diária e da reserva do Santíssimo Sacramento já naquela época.
3.5. Confissão
São Basílio parece
ter sido o primeiro a instituir a confissão auricular. Aconselhava-a,
sobretudo, aos monges em relação a seus superiores, ainda que não fossem
sacerdotes. Evidentemente, neste caso não era sacramental, mas disciplinar.
Quanto aos
que cometiam pecados graves e se preparavam para receber o Sacramento da
Reconciliação, “na Epístola canônica (cf. vol.1 p.419s) menciona quatro
graus: o estado ‘dos que choram’, cujo posto estava fora da igreja
(προίσκλαυσις); o
estado ‘dos escutam’,
que estavam presentes para a leitura das Sagradas Escrituras e para o sermão (άκρόασης); o estado ‘dos que se prostram’
que assistiam de joelhos a oração (υπόσταση); por último,
o estado ‘dos que estavam de pé’
durante todo o ofício, mas não
participavam da comunhão (σύστασις).”[11]
Os três
primeiros estados duravam três anos, e o último durava dois. Só após este
período o pecador poderia ser readmitido na comunidade e na Eucaristia.
Como
conclusão, São Basílio nos anima a lutar pela fé nestes tempos laicizados: “Estão prontos os preparativos da guerra
contra nós. Os espíritos estão aguçados contra nós, e as línguas caluniadoras
lançam suas flechas com maior intensidade do que a empregada ao apedrejar
Estêvão aqueles que odiavam os cristãos. Mas, não se escondam! Efetivamente,
pretexto para a guerra somos nós, mas na verdade o alvo em mira está mais alto.
Contra nós, de fato, se preparam os mecanismos de guerra e as ciladas, e
estimulam-se mutuamente ao esforço de dar cada qual o que possui em experiência
e coragem. Mas é a fé que é combatida. Meta comum de todos os adversários,
inimigos da sã doutrina, é abalar o fundamento da fé em Cristo, arrasando,
fazendo desaparecer a Tradição Apostólica.”[12]
Por Rodrigo
Fujyama
[1] Cf.
QUASTEN. Patrología II. p. 224.
[2] Cf.
DROBNER. Manual de Patrologia. p. 276; MONDIN, Battista. Dizionario dei
teologi. p. 99.
[3] Cf.
ALTANER; STUIBER. Patrologia. p. 293.
[4] Cf.
LLORCA; G.ªVILLOSLADA; LABOA. Historia de la Iglesia Católica: Edad Antigua.
7.ed. BAC: Madrid, 2005. p. 462.
[5] Idem.
[6] S.
BASÍLIO MAGNO. Homilia sobre Lucas 12, Homilias sobre a origem do homem,
Tratado sobre o Espírito Santo. Tradução de Roque Frangiotti e Monjas
Beneditinas. 2.ed. São Paulo: Paulus, 2005. p. 25.
[7] Apud
QUASTEN. Patrología II. p. 252.
[8] Idem, p.
251.
[9] Idem, p.
254.
[10] SÃO
BASÍLIO MAGNO. Op. Cit. p. 115.
[11]
QUASTEN. Patrología II. p. 259.
[12] SÃO
BASÍLIO MAGNO. Op. Cit. p. 117-118.
Fonte:
http://academico.arautos.org/2013/09/sao-basilio-magno/
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